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    Leão Serva

    Eletropaulo e os #malditosfios

    DE SÃO PAULO

    28/10/2013 03h00

    A Eletropaulo já tem o plano para enterrar os fios da cidade de São Paulo. A empresa decidiu adotar o protagonismo em um debate que vinha empurrando com a barriga.

    A mudança de estratégia ainda tratada com discrição começou no ano passado quando a multinacional AES encomendou à consultoria McKinsey um amplo estudo incluindo situações no mundo todo e cenários possíveis para o enterramento em São Paulo, com opções técnicas, formas de financiamento, áreas prioritárias e ritmo de realização. Também participaram da elaboração, a Fundação Getúlio Vargas e a Escola Politécnica da USP.

    Um resumo do trabalho, que tem sido levado a autoridades públicas e empresas, foi apresentado ao repórter pelo presidente da Eletropaulo, Britaldo Soares, e três vice-presidentes, na última terça-feira, em atendimento a um pedido de entrevista.

    No mundo todo, há disparidades grandes: Tóquio tem apenas metade de sua fiação enterrada, enquanto as capitais europeias, 100%. Já nos EUA, Nova York enterrou 70% mas Los Angeles, só 20%. Entre os pobres, Mumbai (Índia), já escondeu 95%; a Cidade do Cabo (África do Sul), 70%. São Paulo tem apenas 7% de seus 40 mil km de fios enterrados.

    A McKinsey afirma que nos países ricos, o consumidor pagou a maior parte da conta via tarifas; nos emergentes, o custo é dividido entre consumidores e governos, via desconto de impostos.

    "Nós somos os maiores interessados no enterramento", diz o presidente da AES Brasil, Britaldo Soares, para quem a fiação subterrânea é mais segura e esteticamente mais harmônica. No entanto, dizem seus diretores, o custo total do enterramento é muito alto, corresponde a duas vezes e meia o orçamento de São Paulo ou dez vezes todo o patrimônio da Eletropaulo: a empresa estima em R$ 100 bilhões, ou R$ 5,8 milhões por quilômetro de rua na cidade. A projeção é considerada exagerada por engenheiros presentes à audiência pública no Ministério Público Federal, em maio; nos EUA, esse trabalho recentemente custou a metade, aproximadamente. Mesmo assim, resulta uma conta muito elevada.

    A proposta da Eletropaulo é enterrar nos primeiros dez anos todos os fios aéreos do chamado centro expandido de São Paulo (a região onde vigora o rodízio de automóveis), o que significará esconder 350 km/ano. Essa região mais densa e consolidada da cidade, com 3.500 km de fios aéreos, tem 7% dos clientes da distribuidora de luz, que consomem 25% de sua capacidade instalada. Ali se concentram os empregos que atraem diariamente 30% dos paulistanos, mesmo aqueles que moram na periferia.

    Para o financiamento, o modelo prevê que as empresas que dividem os postes paguem parte da conta; prefeitura, governos estadual e federal entrem com descontos de impostos que incidem sobre o enterramento (obras ou equipamentos) e o município pague o asfaltamento e a reconfiguração das calçadas nas áreas envolvidas. Essa fórmula permitiria o repasse de apenas 20% para as tarifas, num escalonamento que depende do custo do capital.

    O estudo tem informações para apoiar um debate consistente. É preciso que o poder público exerça agora o papel de liderança e ponha os envolvidos na mesa para negociar. A população vai agradecer o desaparecimento dos #malditosfios.

    leão serva

    Ex-secretário de Redação da Folha, jornalista, coautor de 'Como Viver em SP sem Carro', faz pesquisas no Warburg Institute, em Londres, com o apoio da Capes. Escreve às segundas.

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