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    Leão Serva

    Aqui não tem remédio

    09/05/2016 02h00

    O noticiário das últimas semanas aponta uma série de problemas na rede municipal de saúde de São Paulo. Os destaques foram falta de médicos, de remédios e problemas no relacionamento com OSs (organizações sociais), que administram unidades de saúde pública. A imprensa acorda tarde para um nervo exposto da administração de Fernando Haddad (PT). A falta de medicamentos, mais evidente, começou logo após a posse e segue irresoluta, mesmo após a demissão do secretário José de Filippi.

    Recentemente, ao elogiar ações da administração em mobilidade, a coluna ponderou que ela "amarga retrocessos importantes" em outras áreas, como a saúde. A prefeitura protestou. Citou várias realizações, como a entrega de três hospitais na periferia, que Haddad está para cumprir.

    Quanto aos remédios gratuitos, destacou a criação de um site chamado "Aqui Tem Remédio" (aquitemremedio.prefeitura.sp.gov.br ), que permite ao cidadão digitar seu endereço, o nome do medicamento e encontrar onde está disponível, bem como um transporte até lá.

    Além de não ter a divulgação necessária, há uma perversa inversão na concepção do serviço: em vez de resolver o problema de logística levando medicamentos às unidades de saúde, ele propõe que o cidadão vá buscar o que precisa onde a prefeitura tiver conseguido entregar.

    Testei o site com quatro remédios. Todos aparecem em unidades distantes mais de 5 km de minha casa. O omeprazol, para problemas gástricos, estava disponível em duas unidades de saúde a mais de 6 km. A dipirona sódica, para dores e febre, só em duas unidades, a mais de 10 km. Fiz o mesmo com diclofenaco e cefalexina. Sugiro que o leitor faça com outros.

    O trânsito de São Paulo anda a cerca de 12 km/h, uma pessoa marcha a 5 km/h. Ou seja, na melhor das hipóteses, uma hora para ir e outra para voltar. E depois ir trabalhar...

    O site que deveria atenuar a falta de medicamentos é prova de que a administração municipal é incapaz de garantir qualidade a um programa de grande impacto social.

    ESTUDANTES E A ELEIÇÃO

    Durante duas décadas de governo de uma frente liderada pela esquerda, as entidades estudantis se mantiveram quietas e disciplinadas, "pelegas", se poderia dizer. Derrotado o governo da primeira mulher a presidir a nação, uma esquerdista cuja biografia inclui grande sofrimento sob a ditadura que asfixiou o país, imediatamente os movimentos juvenis se acenderam em torno de uma pauta difusa de reivindicações, entre defensáveis e impossíveis.

    Em nome da lei e da ordem, o governo conservador usou a polícia e repetiu aos jornalistas o que lhe parecia óbvio: "Por que não se puseram em marcha antes, contra as mesmas mazelas, sob domínio do governo de esquerda?"

    Depois de quatro anos de policiais batendo em estudantes, o empresário Sebastián Piñera, primeiro conservador a presidir o Chile após o domínio da esquerda, foi derrotado pela mesma Michelle Bachelet, esquerdista derrotada na eleição anterior.

    A semelhança entre Chile e Brasil não é mera coincidência. Estudantes e movimentos de esquerda do mundo inteiro estudaram com atenção o que aconteceu ao sul, onde a direita foi aniquilada na batalha da comunicação.

    Na ocupação de escolas brasileiras começa a ser disputada a eleição de 2018. Cada cacetada policial hoje é um ponto para a esquerda amanhã.

    leão serva

    Ex-secretário de Redação da Folha, jornalista, coautor de 'Como Viver em SP sem Carro', faz pesquisas no Warburg Institute, em Londres, com o apoio da Capes. Escreve às segundas.

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