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    Leão Serva

    Bilhete Único, cobradores e assaltos

    13/02/2017 02h00

    Moacyr Lopes Junior/Folhapress
    Com Bilhete Único na mão, o prefeito João Doria (PSDB) passa por catraca de terminal de ônibusna zona sul de SP
    Com Bilhete Único na mão, o prefeito João Doria passa por catraca em terminal de ônibus da zona sul

    Depois de algumas semanas com noticiário concentrado em ações de zeladoria (limpeza de ruas e guerra ao picho), importantes, sem dúvida, a Prefeitura de São Paulo começa a falar da questão realmente decisiva em administrações municipais paulistanas: ônibus. Nos últimos dias, saíram anúncios de que está sendo preparado um corredor inteligente (chamado BRT) na zona Sul; que a administração planeja a privatização da gestão do Bilhete Único e a eliminação dos cobradores. Ótimo.

    A concessão do bilhete único à iniciativa privada poderá render um bom dinheiro. Mas pode ser ainda mais valiosa para as empresas financeiras se incluir os outros municípios da Grande São Paulo, onde uma grande parcela da população vem para a capital diariamente. A arrecadação será maior e a "compensação" única e mais simples dará escala ao comprador. Cabe à prefeitura e ao governo do Estado liderarem a negociação para criar uma autoridade metropolitana, começando pela unificação da bilhetagem.

    É bom saber também que a Prefeitura avança no plano de eliminação dos cobradores. A mesma redução das transações com dinheiro vivo torna inexorável a eliminação desses funcionários. No entanto, a proposta destacada pela Folha (em 6/2) é a mais confusa e ineficiente entre as várias em discussão na Prefeitura: aumentar a tarifa para quem paga com cash aumenta a lista de preços; dá aos críticos a chance de acusar um aumento da passagem e cria uma justificativa para perpetuar o cobrador.

    O mais provável é que, como ocorre em outras metrópoles, a administração opte por zerar ou reduzir a quantidade de veículos em que se pode pagar a viagem com dinheiro, enquanto a maioria passa a aceitar só pagamento com cartão. Para não ficar esperando mais tempo no ponto por um veículo "com dinheiro", os usuários carregam seu bilhete antes ou, no futuro, usarão cartão de crédito/débito.

    Há uma razão adicional para eliminar completamente os pagamentos com dinheiro nos coletivos: eles são causa de assaltos. Dados do Brasil e do mundo mostram uma correlação exata entre a redução do percentual de passagens pagas com dinheiro e a queda do número de assaltos a ônibus. Esse dado vem sendo observado em São Paulo desde a implantação do bilhete único, em 2004, e é estranho que não seja amplamente divulgado, em defesa da segurança dos usuários e como argumento irrespondível pela eliminação dos cobradores.

    Até a adoção do Bilhete Único, 100% das passagens eram pagas com dinheiro; depois, esse índice caiu para cerca de 40% (em 2005) e o número de assaltos caiu na mesma proporção. As curvas baixaram ano a ano de forma idêntica. Hoje, só 6% dos passageiros pagam a viagem com dinheiro. E os assaltos correspondem a 3% dos registrados em 2003.

    Essa relação não ocorre apenas no Brasil: a revista britânica "The Economist" noticiou (7/1), em reportagem que relaciona o aumento da segurança pública à redução da circulação de dinheiro vivo, que os assaltos a ônibus em Londres caíram 56% entre 2013 e 2015, "coincidindo com a redução no número de pagamentos de passagens em cash". Aqui, como lá, acabar com o cobrador e com pagamentos em dinheiro é fundamental não só pela economia, mas também para a segurança dos usuários.

    leão serva

    Ex-secretário de Redação da Folha, jornalista, coautor de 'Como Viver em SP sem Carro', faz pesquisas no Warburg Institute, em Londres, com o apoio da Capes. Escreve às segundas.

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