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    Leão Serva

    O que Jesus diria da Previdência Social brasileira

    01/05/2017 02h00

    Enquanto brasileiros se digladiam entre os que defendem a Previdência Social tal como está hoje e os que preferem as pequenas alterações cosméticas propostas pelo governo, o sistema estatal de aposentadoria compulsória vai seguir sem qualquer alteração nos seus principais defeitos.

    Um deles, o mais simples de resolver e por isso mesmo mais perverso, é funcionar conforme um comportamento condenado por Jesus Cristo na Bíblia, que é guardar o dinheiro dos outros sem investir nem fazer render. É o que se lê na parábola dos talentos.

    A Previdência brasileira funciona como um bolão que os trabalhadores na ativa fazem para dividir entre os aposentados. O INSS só recolhe o dinheiro, divide o resultado da vaquinha mensal e distribui para os aposentados, sem fazer render, sem criar uma valorização do capital que faça o bolo crescer, como fazem os fundos de Previdência privada. Com isso, os ricos, que têm previdência privada, ficam mais ricos e os pobres, que dependem do esquema estatal, ficam cada vez com menos benefícios.

    No Evangelho Segundo São Mateus, capítulo 25, Jesus conta a história de um homem que sai em viagem. Se você puder, leia a Bíblia. Ou então, confie em minha adaptação da história. Foi mais ou menos assim:

    "Antes de ir viajar, o homem chamou três fundos de previdência, dois privados e um estatal e deu a eles seus bens para cuidarem. O que ele tinha estava tudo em cash. No primeiro, depositou cinco dinheiros; ao segundo, deu dois; e ao terceiro, um.

    Passou muito tempo fora e quando voltou, já estava mais velho, perto do momento de se aposentar (dependendo de sua opinião sobre a reforma da Previdência, você escolhe: 65 anos, 80 ou 120, como Matusalém). Chamou os três fundos para fazerem um balanço. O primeiro contou que tinha investido o valor e a rentabilidade tinha sido de 100%; deu dez dinheiros ao homem; o segundo tinha feito negócios e eles também dobraram o capital; deu quatro dinheiros ao cliente. E o terceiro narrou ter ficado com medo de investir mal e perder o pecúlio e por isso o havia enterrado. Devolveu ao homem apenas o mesmo que havia recebido.

    O homem então disse: 'Mau e negligente: Devias então ter dado o meu dinheiro aos banqueiros e, quando eu viesse, o receberia com juros. Tirai-lhe, pois, o investimento, e dai-o ao que tem os dez dinheiros. Porque a qualquer que tiver será dado, e terá em abundância; mas ao que não tiver até o que tem ser-lhe-á tirado'.

    Jesus perguntou então aos discípulos: Qual dos três era o fundo estatal?

    Judas comentou que não sabia mas perguntou ao vizinho onde deveria investir uns trinta dinheiros que estava para receber dali a pouco. Tomé disse que só acreditaria em tamanha incompetência se pudesse ver. João, que gostava de falar segredos aos ouvidos dos colegas, cochichou a resposta, mas não se sabe qual foi. Mateus, que era funcionário público, reclamou que a parábola era neoliberal e privatista.

    Nessa hora, um fariseu que a tudo assistia quieto se levantou e disse: Nada disso é verdade, porque nem por milagre alguém pode tirar o dinheiro da Previdência Social e investir em bancos. Todos são obrigados a deixar o dinheiro com o mais incompetente dos três, aquele que não investe".

    leão serva

    Ex-secretário de Redação da Folha, jornalista, coautor de 'Como Viver em SP sem Carro', faz pesquisas no Warburg Institute, em Londres, com o apoio da Capes. Escreve às segundas.

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