• Colunistas

    Wednesday, 01-May-2024 15:06:23 -03
    Luciana Coelho

    'American Crime Story', série sobre O.J. Simpson, coloca plateia em dilema

    06/02/2016 17h01

    Quem tem memória dos anos 1990 (televisiva, é bom dizer) deve se lembrar da perseguição à camionete de O.J. Simpson, o Ford Bronco branco se movendo vagarosamente por uma estrada de Los Angeles, a polícia atrás, com dificuldade de vencer o trânsito, e os helicópteros de TV em cima, mostrando em tempo real a fuga do ex-jogador e então ídolo do futebol americano.

    A imagem que tomou as TVs americanas durante a exibição de um clássico de futebol se tornaria icônica, um exemplo da obsessão americana por notícias policiais (o país tem canais especializados em julgamentos) e pela cultura de celebridade, agora reunidas.

    Divulgação
    John Travolta como o advogado Robert Shapiro em "American Crime Story: O Povo Contra O.J. Simpson"
    John Travolta como o advogado Robert Shapiro em "American Crime Story: O Povo Contra O.J. Simpson"

    Simpson era suspeito de matar a ex-mulher, Nicole Brown Simpson, e um homem que estava com ela, Ronald Goldman, a facadas. Ele era negro, era rico, era admirado. O ano era 1994 e três anos antes Los Angeles fora palco de um dos mais graves confrontos raciais daquele último quarto de século, o espancamento do motorista negro Rodney King por policiais, registrado em vídeo.

    A ferida ainda estava escancarada quando Simpson foi preso, algemado e teve a cara estampada em revistas de circulação nacional antes da conclusão do julgamento (a "Time" seria criticada por escurecer a pele do esportista, criando uma falsa imagem sinistra do até então simpático jogador).

    Mas Simpson foi absolvido, e o julgamento visto por mais de cem milhões (na estimativa das redes de TV que o transmitiram) criou mais um cisma entre brancos e negros. Ele foi poupado por ser famoso? Ele seria condenado por ser negro?

    É essa a história que pretende contar a primeira temporada de "American Crime Story: O Povo contra O.J. Simpson", que estreou no Brasil na última quinta (4) pelo canal FX e tem por trás o produtor Ryan Murphy, o mesmo de "American Horror Story". O formato também é de "antologia" -temporadas independentes- e os elencos têm intersecções, como a ótima Sarah Paulson, aqui na pele da ambiciosa promotora Marcia Clark.

    O primeiro episódio deu mostras de que a mão ágil e inventiva de Murphy casa com a história, em geral conduzida de forma mais sóbria que suas outras séries, "Glee" e "Scream Queens". Ainda que haja um e outro momento de licença poética (uma cena de tentativa de suicídio, um diálogo entre amigas-peruas da vítima), não dá para fazer graça nem música com o caso.

    Quem interpreta o esportista na série é o sempre competente Cuba Gooding Jr. (de "Jerry McGuire"), e seus dois advogados-estrelas ficam a cargo de um embotocado John Travolta, na pele esticada de Robert Shapiro, e David Schwimmer, o eterno Ross de "Friends", como Robert Kardashian (o pai das moças que fariam sucesso com um reality show).

    Assistir exige cinismo, um prazer culpado por se celebrar a obsessão norte-americana por crimes. Mas, como o crime real, a série exerce um poder de atração inconteste sobre nossa porção mais torpe.

    "American Crime Story" passa no FX às 22h30

    luciana coelho

    É editora de 'Mundo' e foi correspondente em Nova York, Genebra e Washington. Escreve às sextas sobre séries de TV.

    Edição impressa

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024