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    Luciana Coelho

    'American Gods' antagoniza reverência à mídia e à tecnologia com fé ancestral

    02/07/2017 02h09

    Divulgação
    Ricky Whittle (à esq.) e Jeremy Davies no último episódio da primeira temporada de 'American Gods'
    Ricky Whittle (à esq.) e Jeremy Davies no último episódio da primeira temporada de 'American Gods'

    A primeira temporada de "American Gods" chegou ao fim há duas semanas com muito a digerir. A adaptação do livro de Neil Gaiman para a TV pelo pequeno canal americano Starz, exibida no Brasil pelo Prime Video da Amazon, terá segunda temporada e, muito provavelmente, terceira.

    Mas como os produtores Bryan Fuller e Michael Green vão amarrar todas as histórias e subtramas do livro ainda é uma pergunta a ser respondida, já que pouco mais de 1/3 da trama foi percorrido. Para quem não assistiu a série, este texto contém spoilers.

    O último episódio nos deixa com a reunião de velhos e novos deuses na Casa da Montanha, com Bilqis (Yetide Badaki), a esquecida deusa do amor, a caminho para saldar uma dívida que ela tem com Technical Boy (Bruce Langley) após este tirá-la da sarjeta. Mr. Wednesday (o ótimo Ian McShane) acaba de revelar sua identidade.

    Se até o sétimo episódio a série vinha mantendo tons surrealistas, este final de temporada parece uma obra de Jeff Koons, das mais kitsches e absurdas, com direito a uma versão de Páscoa/Ostara (Kristin Chenoweth) que parece uma Barbie bronzeada e Jesuses para todos os gostos.

    O tom soturno dos primeiros episódios também se dissipa em um humor pervertido, com o alívio cômico a cargo da inusitada dupla Laura (Emily Browning) e Mad Sweeney (Pablo Schreiber), uma noiva-cadáver e um deus azarado.

    A conexão entre os dois ainda não foi bem explorada, com perguntas em aberto para os próximos capítulos: por que Mad Sweeney matou Laura? Por que ela é uma sacrifício? Por que a ladra galesa que o adorava na época da colonização americana tem a mesma cara que a mulher de Shadow (Ricky Whittle)?

    É daí e do encontro dos deuses com Bilqis que o enredo deve avançar, ao menos na versão televisiva.

    Bilqis, aliás, foi a personagem que ganhou a melhor adaptação para a série (a invenção de um personagem inexistente no original, Vulcano, também rendeu cenas impressionantes, muito em linha com o discurso político atual nos EUA).

    Por ser um livro que trata de crenças, fé, busca por respostas e tecnologia escrito em 2001, os 16 anos de intervalo entre páginas e telas parecem uma eternidade, então era preciso alguma modernização.

    Pois a deusa que aparece em várias religiões monoteístas ganha direito a conta no Tinder e a templo destruído pelo Estado Islâmico. É ela a primeira divindade a ser apresentada na adaptação, é ela quem deixa o 'cliffhanger' para a nova temporada, com sua voracidade sexual e sua dívida com o deus jovem.

    É preciso um gosto específico pela narrativa intrincada e visualmente profusa de Gaiman, na qual filosofia, crítica social, fantasia e sátira se misturam com cores fortes, para apreciar "American Gods".

    Ainda patinando um pouco, a série parece que será bem sucedida. As subtramas aos poucos vão se fechando, e, no mínimo, é impossível não apreciar o gosto de Gaiman pelo folclore e a psique americana.

    *

    A primeira temporada de "American Gods" está disponível no Prime Video da Amazon

    luciana coelho

    É editora de 'Mundo' e foi correspondente em Nova York, Genebra e Washington. Escreve às sextas sobre séries de TV.

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