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    Lúcio Ribeiro

    Zzzzzzzzzzzzzz

    03/12/2013 03h00

    Meu pai, 89 anos, corintiano, já desistiu de futebol há algum tempo. Primeiro porque acredita que tem muita maracutaia e resultados arranjados. Depois porque esses jogos que começam na TV muito tarde em meio de semana conseguem segurá-lo quando muito só no primeiro tempo.

    "Perdeu o jogão ontem, pai?", pergunto.

    "Aquele 0 a 0 tava chato e eu fui dormir", ele responde.

    "Mas, pai, saíram três gols no primeiro tempo..."

    Ex-empolgado com o esporte bretão, os únicos contatos que ele mantém com a bola hoje em dia são esta coluna, para prestigiar (impressionar) o filho (mesmo eu tendo certeza que ele não acompanha 90% dos assuntos que eu venha a escrever), e jogos da seleção brasileira.

    Estes ele não perde, ainda que às vezes me perguntando momentos antes de um jogo do Brasil começar quem vai ser o adversário.

    Mas, até abdicando (quase) totalmente do futebol, ele ainda insiste em soltar suas "palavras de sabedoria". Ou melhor, "perguntas" de sabedoria.

    No domingo, estávamos vendo um replay de gols do título do Flamengo na Copa do Brasil e ele vem e afirma que o Corinthians fez bem em pegar esse técnico dos cariocas para 2014, já que "fizeram a burrada" de mandar o Tite embora.

    E eu para explicar que o Mano Menezes abandonou o Flamengo na draga há dois meses e que aquele jogo não era o mesmo de dois meses atrás, contra o mesmo Atlético-PR, quando o Mengo foi goleado no Maracanã e Mano pediu demissão dizendo que o time não funcionava?

    Durante a transmissão do jogo do São Paulo, ele mostrou sinceridade ao perguntar duas coisas significativas: "Esse Ganso do São Paulo é aquele Ganso?" e depois "Esse Luis Fabiano é aquele Luis Fabiano?"

    Comentamos rapidamente sobre o Tricolor e contei que o time havia acabado de perder para a Ponte Preta na Sul-Americana. E que o time de Campinas pode ser o único paulista na Libertadores. E que ia fazer sua primeira final internacional da vida amanhã, no Pacaembu, um jogo portanto perto da minha casa e que, talvez, eu até fosse ver in loco.

    "A Ponte não caiu no Brasileiro? Essa Sul-Americana tem a ver com a Libertadores? A Ponte mandando jogo no Pacaembu?"

    Enquanto os gols da rodada iam acontecendo e a situação do Fluminense se mostrava catastrófica rumo à Série B, meu pai indagou: "O Fluminense não foi o campeão do ano passado?"

    A conversa dominical com meu pai em frente à rodada na TV estava tão focada no bizarro do futebol que eu resolvi virar para ele e dizer que o Athletic Bilbao estava ganhando do Barcelona do Neymar, que perdia sua segunda partida consecutiva. A primeira derrota no Espanhol sem o Messi em quatro temporadas e a segunda vez que o Barça perde duas seguidas no ano.

    Mas meu pai já estava dormindo faz tempo, desde lá o Criciúma x São Paulo. Nem tinha visto eu mudar de canal.

    lúcio ribeiro

    Escreveu até dezembro de 2013

    É jornalista de cultura pop, editor do blog Popload, no UOL, colaborador da "Ilustrada", mas acha que no fim gosta mais de futebol do que de música.

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