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    Lucy Kellaway

    Opinião: Elogios funcionam melhor quando feitos em particular

    LUCY KELLAWAY
    DO "FINANCIAL TIMES"

    23/09/2013 14h56

    Não muito tempo atrás, eu estava em uma reunião privada com o presidente-executivo de uma empresa e alguns de seus assessores. Antes de a sessão começar, ele se voltou a um deles e disse "ótimo trabalho em xyz. Perfeito! Meus parabéns".

    É exatamente assim que elogios supostamente devem ser feitos. Foi imediato, específico e feito em público.

    Olhei para o homem que acabava de ser elogiado e imaginei que ele tinha crescido um pouco. E depois olhei as demais pessoas em volta da mesa e a imagem que me surgiu foi a de que tinham encolhido.

    É um efeito que já observei muitas vezes. Se você observar o rosto de um jornalista quando um colega é informado de que seu mais recente artigo é maravilhoso, o normal será que a pessoa finja que está tudo bem; e ela pode até se forçar a dizer que sim, o artigo é mesmo brilhante. Mas quem observa com cuidado percebe uma expressão de ligeira irritação em torno dos lábios, como se a pessoa tivesse acabado de chupar um limão.

    Os especialistas estão errados, quanto aos elogios: eles raramente devem ser feitos em público. São uma substância perigosa e corrosiva que tem efeito poderoso e positivo sobre a pessoa que os recebe mas cuja aplicação funciona melhor por trás de portas fechadas.

    Sempre suspeitei que fosse esse o caso, mas agora existem dados que o provam. De acordo com um novo estudo, os danos colaterais causados pelos elogios são ainda piores do que eu imaginava. Não só os espectadores da cena se voltam contra a pessoa elogiada como passam a desgostar instantaneamente da pessoa que faz o elogio.

    O estudo foi conduzido por Elaine Chan e Jaideep Sengupta - a mesma dupla que chegou a uma das percepções sobre gestão que mais aprecio. Dois anos atrás, eles provaram que, quando o assunto é lisonja, não há exagero que assuste. Mesmo que saibamos que um elogio é insincero, continuamos a aceitá-los - por mais exagerada que seja a dose.

    Agora, eles decidiram estudar os efeitos colaterais da lisonja sobre os espectadores inocentes.

    O estudo, que será publicado pelo "Journal of Consumer Research", descreve uma experiência na qual centenas de universitários foram instruídos a imaginar que estavam em uma loja de roupas, onde ouviam um vendedor dizer a outro consumidor que a roupa experimentada caía muito bem para a pessoa.

    Eles foram solicitados a descrever primeiro sua resposta imediata, e depois uma resposta mais ponderada. As reações instintivas eram quase todas adversas, enquanto as mais ponderadas - ou seja, aquelas calculadas para consumo público - eram bem mais positivas. Ainda mais revelador era o fato de que quanto mais o universitário conhecesse a pessoa que estava sendo lisonjeada - por exemplo, se a pessoa fosse sua colega de universidade -, maior a inveja.

    O paralelo com um escritório é evidente: se você ouve por acaso elogios a um funcionário de outro departamento, isso não o afeta, mas caso a pessoa sentada ao seu lado receba um elogio do chefe, o efeito é parecido com beber ácido.

    Isso significa que a maioria dos executivos está agindo de forma completamente errada. Foram ensinados que parte vital de suas funções é circular pelo escritório distribuindo elogios aqui e acolá. Acreditam que isso signifique apenas a celebração do sucesso de algumas pessoas e motivação para que as demais se esforcem ainda mais. Mas o que estão realmente fazendo é criar ressentimento, e se tornando profundamente impopulares.

    Da mesma forma, todos aqueles programas amados pelos "bons" empregadores - por exemplo a escolha de um funcionário do mês ou a publicação de perfis elogiosos sobre funcionários no boletim informativo da empresa - fazem mais mal que bem.

    Seria possível alegar que não importa se elogios públicos causam dor aos egos frágeis, desde que eles levem todos os trabalhadores a se esforçar mais. Mas será que isso procede? A resposta é que nem sempre.

    De acordo com o psicólogo Niels van der Ven, há dois tipos de inveja. Há a inveja benigna, que motiva a pessoa a tentar fazer melhor que aqueles a quem inveja. E a há a inveja malévola, que faz com que você queira arrastar essas pessoas para fora e fazer algo de indizível com elas.

    Na experiência, inveja benigna surgia quanto os universitários acreditavam que as lisonjas fossem genuínas. Nesse caso, o efeito era positivo: muitos dos participantes disseram que se inclinariam mais a comprar roupas caras, nesses casos, para com isso também parecerem fabulosos.

    Mas meu palpite é que na maioria dos escritórios a inveja em geral seja malévola. Mesmo em caso de elogios merecidos, é preciso que sejam percebidos como merecidos para que tenham efeito benigno. Mas dada a natureza humana, esse nem sempre é o caso.

    O melhor texto que um curso de gestão poderia usar quanto a isso são os livros infantis da série Horrid Henry. Os elogios incessantes a Perfect Peter de forma alguma fazem com que Horrid Henry tente se comportar melhor, nem por um segundo. Em lugar disso, o levam a fazer todo o possível para imaginar algo de realmente horrendo a infligir ao seu irmão menor.

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

    lucy kellaway

    Escreveu até julho de 2017

    É editora e colunista de finanças do 'Financial Times'.

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