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    Luiz Horta

    Tão variados quanto os vinhos, chás merecem atenção especial

    24/07/2016 02h00

    Fernando Sciarra/Folhapress
    Chá da tarde para a coluna volta e mesa de Luiz Horta de 24/07

    Vamos tomar um café?", todo mundo aceita. "Vamos tomar um chá?" aí muda a resposta: "Você está doente?!". Este diálogo me entristece, sou bebedor de chá, tenho um armário de pacotes, cada viagem trago alguns diferentes (da última foram os deliciosos produzidos nos Açores, comprei em Lisboa, com nomes poéticos como "Encosta da Bruma"). Convido amigos para o "tradicional" chá com empadas aqui em casa, combina bem, acredite. Quando quero sair um pouco da bruteza do cotidiano, monto uma mesa variada de chás.

    Esta semana, afrancesado, queria fazer uma de estilo, como as dos grandes hotéis de nomes importantes, os históricos Le Meurice e George V. Fazer de minha casa um hotel francês de luxo é tarefa complicada, mas há truques: uma xícara mais fininha, apagar as luzes e acender uma vela na mesa ajudam (imaginação é para isto). O que importa mesmo é a qualidade e a variedade de coisas para comer com a bebida e muita água quente.

    O chá da tarde francês difere do inglês por ter mais produtos de confeitaria (melhores também, mas aí já é opinião), toda aquela pâtisserie inigualável, e, claro, pela taça de champanhe que dá o impulso inicial.

    Para fazer um grande chá foi preciso consultar a Carla Saueressig, especialista que tem sua loja (e agora casa de chás) há dez anos. Falar com ela significa tomar várias xícaras e passar uma tarde nos vapores do pu-erh.

    Chá é tão variado quanto vinho, merece mais que engolir desatento um saquinho suspeito comprado no supermercado, vagamente com cheiro e gosto de temperos velhos.

    Nesta coluna, não fui a lugares pouco conhecidos no mapa de São Paulo. Mesmo assim, pelo exotismo e peculiaridade dos chás que bebi, posso dizer que fiz uma longa jornada. Começamos por um chá preto da Nova Zelândia, depois um matchá excelente, passamos por um Ooolong refinado e terminamos nesta paixão comum (Carla animou-se por eu gostar, talvez seja meu tipo de chá preferido): o pu-erh.

    Trouxe para casa um deles, mas recomendo começar por algo mais simples de entender, como um orange pekoe do Sri Lanka. Se quiser montar uma boa mesa, eleja pelo menos três, um pretinho básico, que tem mais cafeína e é o que todo mundo entende como chá; um mais floral ou frutado, como os com jasmim ou sakura, as flores de cerejeira; e um mais pauleira, para ir treinando o gosto, um lapsang souchong, por exemplo, defumado e potente (outro grande favorito).

    Carla serve o chá completo, os dados estão no serviço, e vende a granel os chás especiais. O que me encantou, o China Mannong Pu Ehr Orgânico -fermentação de sete anos custa R$ 152 os 50 gramas, mas ela vende 25 gramas também.

    SESSÃO DA TARDE
    O quê Croissant e manteiga temperados com chá, torradas, geleias, sanduíches, quiches, bolos e chá à vontade
    Quanto R$ 75
    Onde A Loja do Chá | Tee Gschwendner (Shopping Iguatemi - av. Brig. Faria Lima, 2.232, Jardim Paulistano)
    Quando Dde ter. a sáb., das 16h às 20h

    *

    Qual chá?

    O pu-erh é como gaita de foles, fígado ou jiló: ama-se ou se detesta. Eu não vivo sem (ninguém perguntou, mas também gosto das outras coisas da lista, com ênfase para o amargo do jiló). É um chá da província chinesa de Yunnan, fermentado e oxidativo, tem leve cheiro de peixe, de coisas marinhas, algas, alguns chegam a ser salinos. Tenho alguns safrados em casa, o mais antigo é o 1988 e o mais jovem, o 2004, deliciosos. Fico considerando comer só com chás e não vinhos, e este daria uma boa dupla com uma carne assada. Só agora, escrevendo a coluna, percebi que são a versão dos vinhos Madeira na xícara, mesmo traço de aromas remotos e de erva longamente guardada. Pela longevidade são caros, evoluem com o tempo, parecem vinhos nesse aspecto também.

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    Divulgação
    Vinhos da coluna de Luiz Horta de 24/07

    E para terminar

    Com tantos doces, tortas, mil-folhas, dá para culminar o chá com uma tacinha de fortificado, Moscatel de Sétubal, Porto ou Madeira. Todo o líquido ingerido dispensaria vinhos, mas entram como digestivo, em quantidade mínima. É desculpa para ter um deles em casa, duram depois de abertos e são uma gentileza extrema, por preço abaixo do prazer que proporcionam. Para ser sincero, nada me alegra mais que bebê-los. Sugiro quatro aí acima, com diferente complexidade, todos bons. Madeira e Tawny são parecidos em estilo, oxidativos, mais outonais, Moscateis de Sétubal deviam ser patrimônio da humanidade: são vinhos, quarteto de cordas engarra

    luiz horta

    Viajante crônico e autor dos livros eletrônicos 'As Crônicas Mundanas de Glupt!' e 'Vinhos que cabem no seu bolso'. Escreve aos domingos.

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