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    Luiz Horta

    Feijoada e vinho combinam?

    20/08/2017 02h00

    Ezyê Moleda/9.out.2012
    Feijoada do restaurante O Mineiro, em São Paulo
    Feijoada do restaurante O Mineiro, em São Paulo

    Tentei de tudo para não vê-la, nem falar sobre. É a comida mais polêmica para vinhos –ganha com larga margem vantagem de aspargos, ovos e outros problemas frequentes nas discussões de harmonizadores compulsivos. Mas a comida brasileira já foi desfilada aqui nas suas versões mineira, baiana, contemporânea, clássica, relida e revista, então chegou a hora, para o meu pânico: não tinha mais como fugir dela, a feijoada.

    O mapa me informa que moro a 750 metros de distância do Veloso, que serve a que considero uma das melhores da cidade. Fui para lá no último sábado (12). Fui e não comi –sem chance de achar lugar. Acabei no Ponto Chic, nada famoso pelo prato, mas não me decepcionei.

    Há toda uma discussão sobre a receita, que precede muito a dos vinhos. Sou da escola Pedro Nava, já devo ter dito isso antes. Pedro Nava, médico mineiro que se dedicou tardiamente às letras, publicou os melhores livros de memórias que a língua brasileira já leu. Mas anda esquecido (sem duplo sentido), o que é uma injustiça. Só para a comida ele dedica ensaios inteiros, em prosa mais que perfeita. Ele também não curtia laranja com o prato, pois solta um caldo desnecessário e empapa o arroz. Nem mesmo o arroz é tao importante, frisava. O negócio é a farinha.

    Ficou claro que estou ganhando tempo antes de falar dos vinhos? Estou mesmo, admito. O motivo para estar postergando o assunto é a cantilena de sempre: nem tudo precisa de vinho para acompanhar.

    Feijoada não é um consenso, mas um jogo aberto para brincar com vinhos. Sugiro comprar um espumante, um rosado, um tinto e um branco e testar. "Ah, mas não entendo nada de vinhos!", já escuto uma vozinha dizendo.

    Ninguém entende antes de experimentar. Vinho começa com uma taça segura, aquele seu primeiro encontro com ele. Que delícia eram minhas certezas no princípio. A escolha infalível era um chileno de bom preço na prateleira e pronto.

    O Chile continua muito bom, melhor nas últimas décadas. Mas o que veio foram as incertezas, as infidelidades, as provas que dão errado, a rejeição de alguns estilos e uvas (Pinotage, agradeço e dispenso). Como todo aprendizado, é preciso começar de algum jeito.

    Eu, que não sei dirigir, comecei ligando o carro, errando as marchas e depois entrando em atrito terminal com a embreagem. Nunca mais voltei. Não é necessário gostar de vinho, ele pode ser sua embreagem. Se quer cerveja, acredite no seu gosto e pronto. Só não invente alergias, a grande desculpa da humanidade para tudo. "Tenho alergia a vinho." Não, você simplesmente não gosta –e está tudo bem.

    Com isso, deixei a feijoada de lado, espertamente. Uma hora volto a ela. Se quer segurança, beba com uma caipirinha. Acho que ela é a melhor escolha.

    *

    A coluna "Volta & Mesa" é publicada aos domingos na revista sãopaulo

    Eduardo Knapp/Folhapress
    Chamada mobile da edição de 20.ago.2017 da sãopaulo
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    luiz horta

    Viajante crônico e autor dos livros eletrônicos 'As Crônicas Mundanas de Glupt!' e 'Vinhos que cabem no seu bolso'. Escreve aos domingos.

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