Meio da tarde de quinta-feira, dia da zorra toda, logo à minha frente, na interligação entre duas estações do metrô de São Paulo, as moças conversam, falam alto; quer dizer, uma fala, a outra ouve e concorda:

- Você viu o que a mulher disse no jornal da TV? Ela disse assim, na maior cara: "Eu não quero que gastem dinheiro com a Copa, eu quero que gastem dinheiro pra dar casa pra nóis". Ah, é, pra nóis, é? Será que ninguém disse pra ela que casa é a gente mesmo que tem que comprar? Que folgada, meu! É assim, filha: você trabalha, trabalha, trabalha, junta um dinheirinho pra dar de entrada, depois paga o financiamento, entendeu ou quer que eu desenho? Se der sorte, termina de pagar antes de morre. Tá pensando o que esta gente, viu, meu, quer tudo na mão, e agora virou moda: vai pra rua protestar, fecha o trânsito e enche o saco da gente, que tem que ir trabalhar e não consegue chegar na hora. Por causa desta vaca cheguei mais de uma hora atrasada, ela estava naquele protesto do Itaquerão, sabe, que a gente pegou de manhã? Eu vi no jornal do meio dia. Que mané protesto, meu! Gente que quer aparecer, ainda mais que agora vai ter gringo prestando atenção. Vergonha, viu, tanta gente vindo pro Brasil e este povo besta arrumando encrenca. Quer protestar, protesta, mas não enche o saco de quem vai trabalhar e nem queima o filme do Brasil, né, meu? Não vai ter Copa? Não vai ter Copa o caramba!"

- Claro que vai ter Copa...

Mesmo dia, por volta das 22h, na avenida Paulista, dois rapazes vestidos de preto fumam e conversam na saída do Conjunto Nacional.

- Te acertou?

- Não, chutei e vazei, véi. Maior cheiro ruim. Achei que ia estourar, mas só soltou fumaça mesmo. Na moral...

- E você foi até o prédio do Ronaldo?

- Eu ia, mas acabei voltando. Fui só um pedaço, mas quando chegou na baixada do Pacaembu a galera começou a dispersar e fiquei na nóia: pouca gente, vai sobrar pra mim...

- Eu também não fui, mas devia ter ido. Detonar aquele babaca, fazer ele pagar por tudo isso...

- Tem que pagar, tem que pagar! O cara é Fifa, véi, o cara é Fifa, morou? Gordo babaca, sentado na grana e defendendo ladrão, véi. Na moral, ia jogar pedra no prédio dele só pra ele ver que é o povo na rua quem manda, morou?

- Mas o vidro do banco na Consolação você ajudou a quebrar, que eu vi, véi!

- Taquei uma pedra, mas errei...

- Na moral, na moral.

- É isso aí, véi, não vai ter Copa!

- Não vai ter Copa, véi!