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    Manuel da Costa Pinto

    Livro reúne ensaios sobre Iberê Camargo e com obras do pintor

    23/11/2014 02h00

    "Pesquisador da noite moral sob a noite física." Assim Drummond descreveu o gravurista Oswaldo Goeldi, numa frase que caberia perfeitamente a Iberê Camargo (1914-1994). O centenário de nascimento do pintor gaúcho (que, aliás, foi amigo e interlocutor de Goeldi) é comemorado nesta semana com o lançamento de "Cem Anos de Iberê".

    O volume reúne textos de catálogos das exposições promovidas nos últimos anos pela Fundação Iberê Camargo —magnífico edifício de Porto Alegre projetado pelo arquiteto português Álvaro Siza. A organização do livro é de Luiz Camillo Osorio, curador da mostra "Um Trágico nos Trópicos", que aconteceu este ano no Centro Cultural Banco do Brasil, em São Paulo.

    No texto de apresentação, além de apontar alguns tópicos abordados por críticos incluídos no livro (Mônica Zielinsky, Sônia Salzstein, Adolfo Montejo Navas e Lorenzo Mammì, entre outros), Osorio destaca o movimento percorrido pela obra de Iberê -de certo modo, uma reversão da linearidade que conduz a arte moderna da narrativa e da experimentação para o abstracionismo e o construtivismo.

    Tais elementos estão presentes na pintura de Iberê dentro de uma sequência que lhe é particular: ele parte de objetos inanimados (porém imantados por densa carga emocional) para atingir a pura matéria pictórica e daí derivar para a figuração desolada de sua última fase.

    As imagens reproduzem, por exemplo, telas da série "Carretéis", em que, sob influência de Morandi (Iberê fez naturezas-mortas e garrafas que emulam o pintor italiano), os pequenos cilindros são a materialização de um tempo estagnado.

    E essa vibração trágica de um movimento sem progressão se projeta nas telas finais, nas figuras de ciclistas que parecem pedalar em falso, dos manequins e dos "idiotas" (título de outra série) que contemplam, atônitos, nossa letargia vital —num resumo do sentido existencial e noturno da obra do artista.

    LIVRO

    Cem Anos de Iberê ****
    Autor: Iberê Camargo
    Organização: Luiz Camillo Osorio
    Editora: Cosac Naify/Fundação Iberê Camargo (448 págs., R$ 70)

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    LIVROS

    No Andar do Tempo ****
    Reúne nove contos de Iberê (um deles ilustrado pelo próprio artista), explicitando o sentido narrativo de sua obra pictórica.
    Autor: Iberê Camargo
    Editora: Cosac Naify (80 págs., R$ 42)

    Gaveta dos Guardados ****
    Textos fragmentários, de feição memorialística, tratam da relação com outros artistas e da experiência em Roma e Paris, nos anos 1940.
    Autor: Iberê Camargo
    Editora: Cosac Naify/Fundação Iberê Camargo (144 págs., R$ 38)

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    DISCO

    Canción Andaluza ***
    Paco de Lucía (Universal, R$ 33,80)
    Paco de Lucía representa para o flamenco aquilo que Piazzolla significa para o tango: uma abertura para os outros gêneros (no caso, o jazz) que não dilui, antes amplifica, as raízes folclóricas. Morto em fevereiro, o violonista espanhol apresenta, em seu último disco, novos arranjos (instrumentais e com voz) para tradicionais "coplas" andaluzas de compositores como
    Quintero, León e Quiroga.

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    LIVRO

    O Homem Diante da Morte ****
    Philippe Ariès; tradução de Luiza Ribeiro (Unesp, 837 págs., R$ 118)
    Clássico de um dos pioneiros da história das mentalidades (que privilegia costumes privados e práticas culturais), essa obra monumental investiga as formas de lidar com a morte desde a Idade Média até os dias atuais. Ariès (1914-1984) relaciona o fatalismo ou o horror diante da extinção às fases da constituição da noção moderna de sujeito.

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    FILME

    Depois de Horas ****
    Martin Scorsese (Magnus Opus, R$ 39,90)
    Um tipo convencional e solitário de Manhattan vai ludibriar o tédio num restaurante e fica cativado por uma moça que lhe deixa o telefone. A caminho do encontro, perde sua única nota de dinheiro e mergulha numa sucessão paranoica de encontros com figuras bizarras da noite nova-iorquina. Sátira com humor negro do encontro dos "yuppies" dos anos 1980 com o "underground".

    manuel da costa pinto

    É jornalista e mestre em teoria literária e literatura comparada pela USP. Escreve aos domingos, a cada duas semanas.

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