• Colunistas

    Thursday, 02-May-2024 11:12:04 -03
    Marcelo Freixo

    Democracia digital

    24/11/2015 02h00

    Quando dava aula de história e precisava explicar aos meus alunos os sentidos das revoluções, costumava dizer que em essência os objetivos são romper e substituir o ordenamento legal. Mudar os rumos, refazer a evolução dos caminhos: revolucionar. Pois o Brasil, país de tantas contradições, vive uma muito singular. Por aqui, teríamos uma revolução se as leis fossem cumpridas e valessem para todos.

    Por isso a importância do pioneirismo da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro ao aprovar uma proposta de emenda constitucional que permite o recolhimento de assinaturas para a apresentação de projetos de iniciativa popular através da internet.

    Ela foi construída por minha equipe em conjunto com pessoas, coletivos e movimentos sociais ligados à defesa da democracia digital.

    Podemos fazer uma retrospectiva histórica para termos ideia da relevância dessa lei.
    Até hoje, desde a promulgação da Constituição, em 1988, apenas quatro projetos de iniciativa popular vingaram no Brasil. O mais recente foi a Lei da Ficha Limpa, cujas assinaturas foram reunidas graças à mobilização popular em torno do tema e do apoio da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

    O baixo número de iniciativas se deve a duas dificuldades. A primeira é a capacidade de recolhimento das assinaturas num país tão grande. Segundo a Constituição, o projeto precisa ser subscrito por pelo menos 1% dos eleitores, cerca de 1,4 milhão de pessoas, distribuídos em cinco Estados, com não menos de 0,3% do eleitorado de cada um.

    Essas regras exigem uma infraestrutura e organização que muitas vezes os grupos não têm. Outro problema é a conferência de tantas assinaturas. Isso fez com que, na prática, a iniciativa popular precisasse ser adotada e apresentada por um parlamentar para poder ser votada.

    O objetivo da assinatura digital agora incorporada à Constituição do Rio é superar essas duas barreiras. Nossa proposta permite que as pessoas se organizem a partir de um mundo em que vivem e militam, a internet. Precisamos ouvir as lições que as manifestações de 2013, primeiras grandes mobilizações em tempos de internet, nos deram: a democracia fervilha nas ruas e nas redes. A segunda vantagem é que a tecnologia facilita a conferência das assinaturas e garante a autenticidade e confidencialidade dos dados.

    Esse projeto vai ao encontro dos anseios de 2013 porque oxigena o parlamento e garante às pessoas o protagonismo e participação efetiva na vida política do Estado. Ele rompe com o patrimonialismo legislativo dos grupos políticos e econômicos que se comportam como donos da democracia.

    Marcelo Freixo

    Escreveu até julho de 2016

    É professor de história e deputado estadual do Rio. Presidiu as CPIs das Milícias, em 2008, e do Tráfico de Armas e Munições, em 2011. Foi candidato a prefeito do Rio em 2012.

    Edição impressa

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024