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    Marcelo Freixo

    República Romérica

    24/05/2016 02h00

    Para mudar o governo e estancar essa sangria. Para salvar a classe política. Por Michel, que também é Eduardo Cunha. Para não sermos comidos numa bandeja. Por um boi de piranha que nos permita chegar à outra margem. Por um pacto nacional para deter a Lava Jato.

    Os trechos da conversa gravada entre o ministro do Planejamento e braço direito de Michel Temer, Romero Jucá, e o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado (PMDB), divulgada nesta segunda (23) pela Folha, mostram que o impeachment da presidente Dilma Rousseff não teve nada que ver com o combate à corrupção.

    A manobra é um golpe tramado por um conluio entre a elite política e econômica que teve suas negociatas ameaçadas. A velha oligarquia quer reorganizar seus interesses, impor uma agenda de privatizações e estancar a sangria provocada pela Lava Jato.

    Muitos dos que lutaram pela derrubada de Dilma e apoiam o governo golpista de Temer, constrangidos com os primeiros dias da gestão peemedebista, silenciam ou defendem que o afastamento imediato de Jucá resolveria a polêmica. A conclusão é mais cínica do que a entrevista coletiva do ministro na manhã desta terça (23).

    O diálogo é gravíssimo porque revela que o então senador e presidente do PMDB articulou a queda da presidente da República para impedir o andamento das investigações da Lava Jato.
    No fim do ano passado, também após o vazamento da gravação de uma conversa sobre a situação de Nestor Cerveró, o senador Delcídio do Amaral foi preso sob a acusação de tentar obstruir o trabalho da Justiça.

    As panelas não soaram quando Temer anunciou um ministério formado por 11 homens envolvidos na Operação Lava Jato. O Hino Nacional não foi entoado quando o presidente golpista escolheu como líder do governo na Câmara André Moura (PSC-SE), que responde a três ações penais no STF e é suspeito de tentativa de assassinato. Será que agora haverá brados contra a corrupção diante de mais um escândalo Romérico?

    Mais do que uma farsa, o episódio evidencia a fragilidade do sistema democrático e a falência do parlamentarismo de extorsão da Nova República. Jucá, que diz ser o construtor de um governo de salvação nacional, é um personagem representativo da degradação do governismo pós-ditadura: ocupou cargos chave nos governos Sarney, FHC, Lula e Dilma.

    A República Romérica de Michel Temer nasceu morta e sem legitimidade. Se o impeachment for confirmado, a única saída é convocar novas eleições e ampliar as mobilizações em torno de uma agenda de profundas reformas que freiem a influência do poder econômico nos sistemas político e eleitoral e os democratizem.

    Marcelo Freixo

    Escreveu até julho de 2016

    É professor de história e deputado estadual do Rio. Presidiu as CPIs das Milícias, em 2008, e do Tráfico de Armas e Munições, em 2011. Foi candidato a prefeito do Rio em 2012.

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