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    Marcelo Leite

    Próstata, o dilema

    07/09/2014 01h40

    Fazer ou não fazer todos os anos ou a cada dois anos o exame de sangue PSA e o famigerado toque retal? Se você é homem e tem mais de 50 anos, certamente ouviu de seu urologista que sim, deve fazê-lo(s).

    A discussão no meio médico quanto à prevenção do câncer de próstata por meio do PSA tem semelhanças com aquela que vem rodeando a do câncer de mama e as mamografias. Não há dúvida quanto aos benefícios - mas e os riscos?

    No caso masculino, estudo publicado em 7 de agosto no periódico médico britânico "The Lancet" trouxe mais um grão de sal ao debate.

    Cerca de 162 mil europeus de oito países foram acompanhados por 13 anos, no levantamento batizado como European Randomised study of Screening for Prostate Cancer (ERSPC, ou estudo randomizado europeu sobre acompanhamento para câncer de próstata)). A conclusão dos autores é que não há razão para generalizar o exame para a população como um todo.

    O curioso é que a pesquisa comprovou que o PSA pode prevenir até um quinto das mortes por tumores de próstata. Precisamente, uma redução de 15% ao longo dos primeiros nove anos e de 22% ao longo de 11 anos. A prevenção, como seria de esperar, melhora com o tempo.

    Uma outra maneira de apresentar os números diz que, para impedir uma morte em nove anos, é preciso fazer o PSA em 1.410 pacientes. Ao longo de 13 anos, bastam 781 exames para evitar um caso fatal.

    Por que, então, não se recomenda disseminá-lo? O PSA não submete o paciente a doses regulares de radiação, como na mamografia.

    O problema é que, uma vez diagnosticada alteração da próstata por meio do PSA, o lógico é tratá-la. E, nos casos em que a indicação é cirúrgica, sempre há o risco de efeitos colaterais indesejáveis, como incontinência urinária e impotência.

    Qualquer pessoa pode entender como essas possibilidades soam assustadoras para um homem, mesmo aqueles que não estejam mais no auge da vitalidade sexual. Não é decisão fácil de tomar (fazer a cirurgia), principalmente quando se sabe que boa parte dos tumores assim extirpados são de lenta evolução e que muitos dos homens operados viveriam o bastante para morrer de outras causas.

    "O rastreamento com PSA permite uma redução substancial nas mortes por câncer de próstata, similar ou maior que as relatadas no caso do câncer de mama", diz Fritz Schröder, professor da Universidade Erasmus (Holanda) que liderou o estudo. "No entanto, o superdiagnóstico ocorre em cerca de 40% dos casos detectados pelo exame e resulta no risco de supertratamento e efeitos colaterais comuns."

    "O momento de fazer o acompanhamento de toda a população ainda não chegou. Necessitamos urgentemente de mais pesquisa sobre meios para reduzir o excesso de diagnósticos, preferivelmente evitando procedimentos desnecessários de biópsia e reduzindo o grande número de homens que precisam ser examinados, submetidos a biópsia e tratados para ajudar só uns poucos pacientes."

    Toda a discussão, como se percebe, gira em torno do que se deve ou não fazer na escala populacional (e que se refletirá nas diretrizes que as sociedades de especialistas recomendam aos médicos). Não chega a ajudar quem precisa tomar decisões individuais. Informação, no entanto, não mata ninguém.

    marcelo leite

    É repórter especial da Folha,
    autor dos livros 'Folha Explica Darwin' (Publifolha) e 'Ciência - Use com Cuidado' (Unicamp).
    Escreve aos domingos
    e às segundas.

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