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    Marcia Dessen

    Trocando em miúdos a linguagem dos gestores profissionais

    03/02/2014 02h00

    Você lê e entende a lâmina de um fundo de investimento antes de aderir? Fica desconfortável por não entender o relatório do gestor que tenta explicar o desempenho da carteira na qual você aplica? Tem o hábito de pedir esclarecimentos, ou acha que o problema é seu e fica constrangido de perguntar?

    Apesar dos esforços da CVM (Comissão de Valores Mobiliários), que regula o mercado de capitais, e de instituições financeiras, ainda há um grande distanciamento entre a linguagem dos gestores profissionais e a que o investidor, mesmo o mais qualificado, compreende.

    Colhi trechos de algumas lâminas e relatórios para demonstrar, com alguns poucos exemplos, como é difícil a vida do investidor que se aventura fora da zona de conforto da básica conta poupança em busca de alternativas de investimento mais sofisticadas, e em tese, mais rentáveis.

    "Adotamos um posicionamento agressivo em relação à curva de juros. O juro de longo prazo já abriu muito mas acreditamos que pode abrir mais." Ou: "Boa parte da carteira de renda variável deve ficar em posições long and short neutras."

    Estou convencida de que o problema não é do investidor. Cabe ao gestor estabelecer uma comunicação que proporcione o pleno entendimento de seu cliente. Enquanto isso não acontece, tomo a liberdade de traduzir os conceitos apresentados em linguagem mais simples. Me perdoem se, apesar da tentativa de trocar em miúdos, não me faço entender. Nesse caso, mais uma vez a falha não é sua, mas minha.

    CURVA DE JUROS

    Taxa de juros tem curva? Ela abre e fecha? Como assim? Vamos ver se consigo sair dessa saia justa. A taxa Selic, taxa básica da economia, será meu ponto de partida. Embora ela seja expressa em termos anuais (10,5% ao ano), remunera transações de curtíssimo prazo, muitas vezes, de um único dia. A taxa de operações de dois, três anos ou mais tende a ser maior para remunerar o risco elevado de uma operação de longo prazo.

    Editoria de Arte/Folhapress

    Em 29/01, era possível comprar uma LTN (Letra do Tesouro Nacional) com vencimento em 01/01/2017 a 12,94% ao ano; a mesma LTN com vencimento em 01/01/2018 pagava taxa de 13,19% ao ano; e a NTN-F (Nota do Tesouro Nacional Série F), com vencimento em 01/01/2025, juros de 13,43% ao ano. Lembre-se de que a taxa Selic nessa mesma data era de 10,5% ao ano.

    Se colocarmos as taxas e os respectivos vencimentos em um gráfico, teremos uma curva ascendente. Curva porque a taxa não permanece estável ao longo do tempo. Ascendente porque a taxa aumenta à medida que o prazo também aumenta, para remunerar adequadamente o risco do investidor que se amplia.

    Fazendo uma conta simples é possível verificar que o prêmio -diferença entre a taxa dos títulos e a taxa Selic- da LTN mais curta é de 2,44 pontos percentuais. A LTN mais longa paga prêmio de 2,69 pontos percentuais, e a NTN-F, prêmio de 2,93 pontos percentuais.

    Se o gestor avalia que a curva "abriu" muito, ou seja, o prêmio dos títulos longos está acima da expectativa de mercado, talvez seja a hora de assumir posições de taxa prefixada com a expectativa de que haverá queda nos juros. Se, por outro lado, o gestor avaliar que a curva pode aumentar ainda mais, ele provavelmente assumirá posições de taxa pós-fixada que ganham em cenário de elevação dos juros.

    LONG AND SHORT

    Você já deve ter ouvido que quando o preço está baixo é hora de comprar e quando o preço está alto, hora de vender. A pressão de compra e de venda acaba colocando o preço da mercadoria no seu ponto de equilíbrio, o valor considerado justo.

    O preço que estava baixo aumenta, gerando lucro para o comprador que adquiriu barato e poderá vender mais caro. O preço que estava alto tende a cair e, dessa vez, quem lucra é o vendedor, que poderá recomprar a mercadoria por um preço menor.

    Essa é a estratégia que ganha a sofisticada expressão "long short" no mundo dos investimentos. Consiste em comprar (long) um ativo barato e vender (short) um ativo caro. Se a expectativa do gestor estiver correta, a carteira tem potencial de lucrar tanto na alta do preço do ativo que foi comprado, quanto na queda do preço do ativo que foi vendido. A estratégia "neutra" ocorre quando a carteira possui a mesma quantidade de posições compradas (long) e vendidas (short).

    E não pense que se trata de lucro fácil, garantido. Fácil falar, difícil de executar. Se a expectativa do gestor não se confirmar, pode ocorrer perda em dobro, na posição comprada porque o preço caiu em vez de subir e na posição vendida porque o preço subiu ainda mais.

    O investidor precisa de tempo, fôlego, caixa e estômago forte para atravessar um período de cenário contrário ao esperado. Muita volatilidade (flutuação de preços) no meio do caminho pode acontecer. Semana que vem eu volto com mais "trocando em miúdos".

    marcia dessen

    É planejadora financeira pessoal, diretora do Planejar e autora do livro 'Finanças Pessoais: o que Fazer com Meu Dinheiro'. Escreve às segundas.

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