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    Marcia Dessen

    Quanto vale 110% do CDI?

    18/12/2017 02h00

    Comugnero Silvana/Fotolia
    Notas de Real

    A internet trouxe acesso fácil a muita informação, coisas boas e ruins, certas e erradas. No universo dos investimentos, lemos, ouvimos e, muitas vezes, acreditamos no que encontramos, mesmo quando
    não conhecemos a fonte.

    Recentemente li uma reportagem, com vídeo, afirmando que o Tesouro Direto é péssimo, que existem formas muito melhores para acelerar o enriquecimento. Uma das sugestões apresentadas é a de investir em ativos que pagam 110% do CDI ou mais. "Uma rentabilidade de cerca de dez pontos percentuais maior do que o CDI", enfatiza o autor da frase.

    Vamos colocar os pingos nos "is" ou, melhor dizendo, os números no seu devido lugar. Taxa de 110% do CDI é uma coisa, dez pontos percentuais acima do CDI outra coisa bem diferente. Para apresentar meu exemplo, preciso de três premissas: taxa Selic = CDI (na verdade, são quase iguais); taxa Selic = 7% ao ano; inexistência de custos de transação.

    A rentabilidade bruta do investidor que compra uma Letra Financeira do Tesouro (Tesouro Selic) ou um CDB (Certificado de Depósito Bancário) a 100% do CDI será de 7% em um ano. O investidor que compra um CDB a 110% do CDI ganhará 7,70% no mesmo período, um ganho adicional de 0,70 ponto percentual.

    Supondo uma aplicação de R$ 10 mil, o primeiro investidor resgatará R$ 10,7 mil, e o segundo, R$ 10.770, um prêmio de R$ 70 em um ano para compensar o maior risco de crédito da operação.

    Para ganhar dez pontos percentuais acima do CDI, a aplicação deveria render 17%, sete pontos percentuais do CDI mais dez pontos percentuais de prêmio. Induz o investidor leigo a supor que ganhará R$ 11,7 mil, R$ 1.000 acima do retorno do Tesouro Selic. Longe, bem longe da verdade.

    Em outro trecho da mesma reportagem, o investidor é provocado a turbinar ainda mais suas aplicações, investindo em CRI (Certificados de Recebíveis Imobiliários) ou CRA (Certificados de Recebíveis do Agronegócio) que pagam 130% do CDI. Rentabilidade maior implica, necessariamente, maior risco. Nesse caso, risco de crédito, sem proteção do FGC (Fundo Garantidor de Créditos), que garante até R$ 250 mil somente de depósitos feitos em instituições financeiras.

    O argumento apresentado é que as operações são "protegidas pelo rating". Rating não protege ninguém, apenas sinaliza, por meio de uma nota, com base nos fatos conhecidos, a capacidade de pagamento de dívidas de uma empresa ou país.

    Cada agência aplica metodologia própria para medir a qualidade de crédito e usa sua escala de ratings para publicar suas opiniões. Normalmente, eles são expressos por meio de letras que variam, por exemplo, de "AAA" (risco de crédito baixíssimo) a "D" (risco de crédito muito alto) para comunicar a opinião da agência.

    São três grandes níveis de classificação: 1) grau de investimento, concedido a países e empresas avaliados como seguros para investir; 2) grau especulativo, quando a possibilidade de inadimplência se apresenta em maior ou menor escala; e 3) default, quando o país ou empresa declara falência.

    As análises e os ratings representam declarações de opinião na data em que são expressas, não constituindo recomendações para comprar, vender ou manter títulos ou para tomar quaisquer decisões de investimento. Ratings e outras opiniões podem ser alterados, suspensos ou retirados a qualquer momento.

    Portanto, o rating é apenas um parâmetro, um indicador, de maior ou menor risco de crédito avaliado em dado momento. Diversas emissões classificadas com bom rating não tiveram um final feliz, impactadas negativamente por fatos novos ou antigos, que não eram de conhecimento público.

    Seja prudente nas pesquisas na internet. Consulte mais de uma fonte. Desconfie de frases e argumentos sensacionalistas. Procure entender os porquês, normalmente omitidos nos breves discursos que tentam impressionar.

    Consulte, preferivelmente, as fontes dos órgãos de regulação e de autorregulação de cada mercado, como a CVM, o BC e a Receita. Se a fonte for uma pessoa física, investigue sua qualificação e se detém uma boa certificação profissional, fato que amplia a perspectiva de competência, ética e comprometimento com o cliente e com os fatos.

    marcia dessen

    É planejadora financeira pessoal, diretora do Planejar e autora do livro 'Finanças Pessoais: o que Fazer com Meu Dinheiro'. Escreve às segundas.

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