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    Marcos Lisboa

    Quem sabe há saída

    12/02/2017 02h00

    Joel Silva/Folhapress
    Mulheres de PMs bloqueiam saída de viaturas no batalhão do comando da Polícia Militar de Vitória (ES)
    Mulheres de PMs bloqueiam saída de viaturas no batalhão do comando da Polícia Militar de Vitória (ES)

    O dramático conflito no Espírito Santo expressa a gravidade da crise dos Estados e os desafios inevitáveis que têm que ser enfrentados.

    A crise fiscal é o efeito colateral de um setor público que durante uma década atendeu às crescentes demandas do setor privado, com incentivos, subsídios e desonerações, e também das corporações de servidores, com seguidos aumentos salariais.

    Nos tempos de bonança, as políticas foram adotadas sem a devida análise da sua sustentabilidade e impacto sobre as contas públicas.

    Além disso, as regras que permitem aposentadorias precoces e generosas, em um setor público que contratou muitos servidores nas últimas duas décadas, resulta no forte aumento do gasto com inativos, que vai aumentar nos próximos anos.

    Com dados ainda incompletos, o TCU calcula o deficit atuarial dos Estados em R$ 2,8 trilhões, cerca de metade do PIB do país. Alguns pesquisadores estimam que o número final pode chegar a 80% do PIB.
    Para se ter uma noção da magnitude, isso significa mais do que dobrar a atual dívida pública, de 70% do PIB.

    A esse número deve-se somar o deficit atuarial da previdência dos municípios, dos servidores federais e da Previdência Social.

    As dificuldades decorrentes do crescimento do gasto incompatível com o aumento da receita foram agravadas com a desaceleração da economia a partir de 2013.

    Em vez de enfrentar os problemas, a opção dos Estados, com apoio do governo federal, foi financiar os gastos correntes com receitas extraordinárias, como novas dívidas ou a venda de receitas futuras.
    Essa estratégia era, claramente, insustentável, e o resultado é a crise dos Estados.

    Algumas corporações se revelam insensíveis aos problemas do restante da sociedade e pressionam para que sejam beneficiadas em detrimento dos demais. Muitos governos tentam obter novas receitas extraordinárias, o que significa uma herança ainda mais grave para os próximos anos.

    Pode-se ceder à pressão e evitar o conflito. Outras corporações vão cobrar o seu quinhão. A longo prazo, o resultado será uma crise fiscal ainda mais grave.

    Quanto antes se consiga uma solução sustentável, menores os custos sociais, caso contrário assistiremos à crescente deterioração da política pública. Se tivéssemos preservado o ajuste fiscal da década passada, esses problemas não existiriam. Soluções temporárias que apenas adiem enfrentar o problema tornarão a crise ainda mais grave, como ocorre com o Rio de Janeiro.

    O Espírito Santo escolheu enfrentar os problemas. Quem sabe o desdobramento desse trágico conflito possa indicar uma saída sustentável, ainda que difícil.

    marcos lisboa

    Marcos de Barros Lisboa, 52, é doutor em economia pela Universidade da Pensilvânia. Foi secretário de Política Econômica no Ministério da Fazenda entre 2003 e 2005 e é Presidente do Insper.

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