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    Marcos Lisboa

    Parque Dom Pedro revela o nosso fracasso

    05/11/2017 02h00

    Não é difícil compreender a extensão do fracasso urbanístico de São Paulo. Basta visitar o entorno do parque Dom Pedro. Para os que não moram aqui, trata-se de uma área com 70 mil metros quadrados ao norte do centro da cidade. Tinha quase 300 mil metros quadrados nos anos 1930.

    Ao seu lado, passa o rio Tamanduateí, em cujas margens foi fundada São Paulo, poucas centenas de metros morro acima. Sucessivas intervenções urbanas retificaram as suas curvas sinuosas e reduziram o seu volume, transformando-o em um tímido e triste riacho poluído. O rio banhava a ladeira que terminava no Porto Geral, que foi aterrado. Atualmente, separa o parque do comércio na rua 25 de Março, marcado pelos muitos descendentes de imigrantes que inventaram São Paulo.

    Há uma vastidão de pequenas edificações abandonadas em meio a poucos prédios que mereceriam ser preservados. A falência do urbanismo e da política de preservação do patrimônio reverbera no entorno do parque, em meio ao abandono recorrente do poder público incompetente que intervém muito e salva pouco. A vista alcança apenas desolação na imensidão de moradias desabitadas.

    Deságuam na região diversos meios de transporte em meio ao caos urbano. São três estações de metrô, um terminal de ônibus e o expresso Tiradentes espalhados na imensa área. Quase 1 milhão de pessoas circulam por dia pela região, no caminho entre a casa e o trabalho. Não há vida no entorno do parque. Há apenas baldeação.

    Cinco viadutos passam por cima do parque. São poucos, entretanto, os carros que os utilizam. Como no restante da cidade, avenidas sufocam os vales onde antes corriam rios à céu aberto.

    O curioso palácio do museu Catavento já foi sede da prefeitura. O governo muda seus locais de trabalho com a facilidade dos que gastam dinheiro dos outros. Constrange contar quantas edificações públicas estão abandonadas, como as muitas descritas por Raul Juste Lores na série "São Paulo Ociosa", publicada nesta Folha. A Casa das Retortas, na vizinhança do parque, ilustra o desperdício e o descaso. Seria de bom tom o setor público optar pela modéstia ao invés da opulência, cuidar do patrimônio e vender os prédios ociosos.

    O parque Dom Pedro merece maior cuidado da sociedade. O seu entorno poderia ser recuperado para a moradia de milhares desde que o poder público regularizasse as propriedades e permitisse edificações mais altas. O adensamento reduziria o custo da moradia e da infraestrutura. Os passantes poderiam contribuir jogando menos lixo nas ruas e nos jardins.

    O parque já foi uma das principais áreas de lazer da cidade. Hoje, desperta uma imensa tristeza em meio à desolação.

    marcos lisboa

    Marcos de Barros Lisboa, 52, é doutor em economia pela Universidade da Pensilvânia. Foi secretário de Política Econômica no Ministério da Fazenda entre 2003 e 2005 e é Presidente do Insper.

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