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    Marcos Lisboa

    A marca do desengano ficou

    03/12/2017 02h00

    Será traumático corrigir os caros equívocos das políticas setoriais da última década. Apenas o subsídio concedido nos empréstimos do BNDES entre 2009 e 2014 custou mais de R$ 320 bilhões. Não deveria surpreender. Fracasso similar ocorreu nos governos JK e Geisel. Ambos também adotaram medidas de incentivo à produção local que resultaram em longos anos de crise e muitas empresas incapazes de concorrer com a produção externa.

    O nacional desenvolvimentismo acredita que produzir localmente é preferível à importação. O nosso atraso decorreria de duas causas principais. Em primeiro lugar, empresas estrangeiras remeteriam lucros extraordinários às suas matrizes. Em segundo, o comércio internacional nos seria desfavorável. Exportávamos matérias primas, como café e açúcar, cujos preços tenderiam a diminuir em comparação com os bens industriais. Superar o atraso passaria pela restrição à remessa de lucros e por produzir aqui tudo o que fosse possível.

    Essas conjecturas estavam erradas. A Light exemplifica a empresa estrangeira denunciada por seus supostas tarifas e lucros excessivos em meados do século 20. Marcelo Jourdan, porém, analisou os seus balanços e mostrou que as tarifas e lucros foram abaixo do mínimo esperado.

    Os preços dos bens primários não tiveram uma tendência à queda no século passado. Os preços dos bens industriais para produção, por outro lado, caíram cerca de 3% ao ano desde 1945. Há mais. O principal fluxo de comércio nunca foi entre os países ricos e pobres, mas sim entre ricos e ricos. Como apontou Krugman, a especialização em algumas atividades resulta em maior produtividade. Os países desenvolvidos vendem para o exterior parte do que cada um faz melhor e, com esses recursos, importam o que não produzem, principalmente dos demais desenvolvidos.

    Poderíamos ter nos especializado em alguns setores da indústria e da agricultura. Ao tentar fazer quase tudo, condenamo-nos a ser um país mais pobre do que o necessário. Muitas empresas se revelaram inviáveis, acabou o dinheiro para subsidiá-las e várias medidas, como o Inovar Auto, violam acordos internacionais, enquanto outras prejudicam a produtividade, como o Finame. Entretanto, recursos e empregos foram alocados a essas atividades. Tarefa dura: administrar a transição das políticas equivocadas minimizando o custo social e preservando a credibilidade de um país que muda as regras com a ligeireza que revela a nossa incompetência.

    JK e Geisel tiveram sorte. Não havia reeleição na época, e a culpa sobrou para o sucessor. Caso contrário, teriam entrado para a história com a mesma reputação de Dilma Rousseff na economia.

    marcos lisboa

    Marcos de Barros Lisboa, 52, é doutor em economia pela Universidade da Pensilvânia. Foi secretário de Política Econômica no Ministério da Fazenda entre 2003 e 2005 e é Presidente do Insper.

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