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    Marcos Augusto Gonçalves - Marcos Augusto Machado Gonçalves

    Brasil à espera de um terremoto

    20/01/2015 07h18

    Depois de seus 15 minutos de fama como um "darling" emergente internacional, o Brasil anda caído. A capital de seu Estado mais rico, São Paulo, que gosta de se projetar como metrópole global, retroagiu à roça. Falta água, falta luz, falta segurança, falta planejamento e competência.

    Responsável pela gestão do Estado há anos e anos, o PSDB paulista, que já foi um partido "inteligente", com pretensões cosmopolitas, é hoje uma agremiação jeca, conduzida por um governador medíocre, de mentalidade interiorana e conservadora, que goza de sofrível reputação como administrador entre seus próprios correligionários –as opiniões da ala serrista quanto a isso são enfáticas e constrangedoras.

    Conceda-se que a avaliação de rivais políticos, ainda que ligados à mesma sigla, precisa ser tomada com cautela, em seu intuito subjacente de prevalecer nas disputas internas. Não é preciso, todavia, levá-la em conta: as deficiências da administração tucana em São Paulo falam –ou gritam– por si próprias. Da ampliação morosa e superfaturada do metrô aos sucessivos fracassos na segurança pública (que a redução das taxas de homicídio já não ocultam), passando pelas dificuldades de importantes instituições do Estado, os sinais de que a locomotiva está virando carroça são facilmente perceptíveis.

    Nada, contudo, compara-se à "crise hídrica", este monumento à incompetência ofertado à população pelo governador e alguns de seus antecessores. É um escândalo, cujas piores consequências ainda estão por se materializar.

    Mas, é o Brasil, como dizia, que está caído –e não apenas São Paulo. Também no plano federal nos ameaça uma administração medíocre, com visão de curto alcance, responsável por algumas políticas públicas desastrosas –da área energética à de segurança– e por medidas econômicas redondamente equivocadas, que levaram a presidente a nomear uma equipe de economistas contrária a suas "ideias", com a missão de reorganizar as contas da quitanda.

    Também o PT, a exemplo de seu antagonista tucano, só decai. Tornou-se um partido patrimonialista, fisiológico, dividido, manchado pela corrupção, que já não consegue unir em torno de si nem mesmo o leque à esquerda do espectro político. Sua face triunfante tem o frescor e a vivacidade dos semblantes de Mercadante e Berzoini –e isso não é nada animador.

    O "novo" ministério da presidente Dilma Rousseff é um atestado eloquente da degradação a que se chegou. Nada se pode esperar de um governo que escala Aldo Rabelo para cuidar da Ciência e Tecnologia –em meio a um séquito de personagens diminutas contempladas com um lote de primeiro escalão ("gourmet"?) no condomínio do poder federal.

    E o que dizer, a propósito, da gestão do petista Agnelo Queiroz no rico Distrito Federal? Uma tentativa de absolver Alckmin?

    Nas relações com o Congresso, a estratégia de "governabilidade" do PT é o velho balcão de negócios, do qual o mensalão foi um aperitivo. É uma patética deserção das promessas originais do parido, que um dia acenou com seu suposto papel de moralizador e modernizador da cultura política brasileira.

    O fato é que para onde quer que se olhe, o quadro é sombrio. O vício governa, escoltado pela falta de imaginação, de criatividade, de ambição, de ousadia e de compromissos. De onde virá a força da renovação? Virá?
    Difícil dizer, nessa paisagem política plana e desértica.

    Pode-se supor, isso sim, que um abalo sísmico ocorrerá: a lista de políticos acusados de envolvimento no Petrolão será extensa. Vai-se caracterizar não o mero "desvio de maus funcionários" ou os "malfeitos" deste ou daquele larápio público, mas o comprometimento estrutural do edifício. Não será difícil considerar que muitos dos ausentes da lista da Operação Lava Jato poderiam figurar em outras, caso as investigações se estendessem ao conjunto de estatais e órgãos públicos.

    Resta saber se o efeito será semelhante ao daqueles terremotos providenciais de telenovela, que eliminam uma multidão de personagens e "consertam" a história no final. Não vamos perder os próximos capítulos.

    marcos augusto gonçalves

    Foi editor da 'Ilustríssima'. É autor de 'Pós Tudo - 50 Anos de Cultura na Ilustrada' e de '1922 - A semana que Não Terminou'.

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