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    Marcos Augusto Gonçalves - Marcos Augusto Machado Gonçalves

    Estão nos tratando como volume morto

    27/01/2015 08h47

    Não são apenas os reservatórios de regiões, Estados e grandes cidades brasileiras, como São Paulo e Rio de Janeiro, que descem ao volume morto e comprometem o abastecimento de água e de energia. É o país, em sua crise de inteligência, em sua perda de ambições, em sua miséria política, que vai secando. É o Brasil que atinge o volume morto.

    Apesar das conhecidas melhorias das últimas décadas (num ciclo que consolidou instituições, deu ao país uma moeda, reduziu a miséria e promoveu considerável ascensão social), a "restrição energética" de nossa atual vida pública é preocupante.

    Esgarçou-se ainda mais, nas últimas eleições, o tecido das relações entre o mundo político e a sociedade –se não em seu conjunto, ao menos em sua massa mais educada ou menos ignorante, que vive nas cidades, precisa de serviços melhores e percebe o crescente descompasso entre seus esforços pessoais e os que lhe são retribuídos pelos governantes e pelas empresas privadas.

    As exceções, sempre louváveis, não interessam. O que interessa é a regra. E a regra que nos está sendo proposta é a do nós aqui e vocês aí: a consolidação de uma casta política medíocre e desonesta, que se compõe entre si e com setores do poder econômico ao sabor de suas conveniências, enquanto o resto assiste –e participa como vítima– do espetáculo da incúria, da incompetência, dos desvios de recursos e das coisas que não funcionam.

    Não apenas as grandes coisas, como a saúde, a educação ou a segurança. É a burocracia do dia a dia, são os espaços públicos mal organizados, as perdas de tempo desnecessárias, as extorsões contratadas que vão dos impostos e juros bancários aos preços da sofrível telefonia e do acesso veloz à internet.

    Bem mais do que exageros e inverdades inerentes à disputa eleitoral, o que se viu nas últimas eleições foi a mentira deslavada, a ficção mal intencionada, a tapeação mais cínica.

    Vitoriosos os farsantes, segue o show, que nem a claque já se anima a aplaudir. Não há nenhuma prestação de conta, nenhum tipo de esclarecimento adulto e minimamente franco aos cidadãos. A mensagem é: "fazemos o que nos interessa e vocês por favor não atrapalhem".

    Somos tratados como crianças que não entendem nada, fáceis de enganar –basta contar uma lorota que está bom. Ou seja, a regra, ao que parece, é nos converter em volume morto.

    marcos augusto gonçalves

    Foi editor da 'Ilustríssima'. É autor de 'Pós Tudo - 50 Anos de Cultura na Ilustrada' e de '1922 - A semana que Não Terminou'.

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