• Colunistas

    Sunday, 19-May-2024 17:15:55 -03
    Marcos Caramuru de Paiva

    China sem consenso para reforma

    16/11/2013 03h00

    Muito se especulou sobre as mudanças divulgadas pelo Partido Comunista chinês na reunião do seu Comitê Central nesta semana. O próprio partido alimentou as especulações. Yu Zhengsheng, ex-chefe político de Xangai, o quarto homem na hierarquia, antecipou que anúncios sem precedentes seriam feitos.

    No mundo e na própria China, criou-se a sensação de que uma grande virada estava por acontecer. Em estatais chinesas, armou-se um clima de insegurança. Qual seria o destino das empresas públicas?

    O resultado da reunião foi bem menos expressivo do que se antecipou. O comunicado emitido pelo Comitê Central menciona 22 vezes a palavra reforma.

    Mas, ao fim e ao cabo, as decisões mais importantes foram genéricas: incorporar as reformas na agenda política, o que muitos já davam como óbvio, e criar um comitê para detalhá-las, o que parece uma medida protelatória.

    Ao lado disso, estabeleceram-se algumas diretrizes gerais para o futuro: a alocação de recursos na economia seguirá parâmetros de mercado, a gestão pública estará baseada em regras, haverá reforma tributária e da previdência social, permanece vigente a estratégia de criar zonas econômicas especiais.

    A conclusão mais evidente a tirar é que o partido precisa primeiro mudar a si mesmo para depois mudar a China. Muitos dentro da instituição parecem não entender como é possível reformar, abrir mão do campo coletivo e do papel central das estatais mantendo o comunismo. Formar consensos é mais complicado do que se antecipou.

    As reações foram bastante frias. Um dia depois do término do encontro, Wang Jianlin --líder empresarial que nunca passa despercebido, por ser o homem mais rico da China-- declarou que, se as reformas não tocarem o governo, o povo ficará desapontado.

    O "China Business News" sugeriu que o governo movesse o poder dos níveis mais baixos para os mais elevados para tratar dos temas tributário e financeiro; uma indicação para a liderança se impor.

    E a revista "Caixin" reconheceu que os grupos com diferentes interesses se ampliaram muito na China. Sua mensagem é que, para promover reformas, será necessário desenhar uma moldura intelectual nova, dar uma roupagem aceitável aos temas do campo e das estatais, inventar novos conceitos que possam se impor aos bloqueios ideológicos e convencer os conservadores de que a China reformada ainda vai ser comunista.

    O que se diz agora é que o partido divulgará detalhes das minutas do Comitê Central para mostrar que houve mais substância do que se imagina.

    Talvez a reunião acabe ajudando a provocar um debate mais aberto sobre as reformas, o que, por si só, já será positivo. Talvez traga à tona as divergências que todos sabem existir, mas que parecem varridas para debaixo do tapete. Talvez não.

    Mas, se as divergências não forem resolvidas, os sonhos de uma China vibrante e poderosa poderão murchar mais rapidamente do que se imagina. Com isso, o ambiente e o humor positivo nacional naturalmente se alterarão.

    marcos caramuru de paiva

    Escreveu até janeiro de 2015

    Diplomata, sócio e gestor da KEMU Consultoria, com sede em Xangai.

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024