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    Marcos Troyjo

    As globalizações do G2

    11/10/2013 03h05

    O cabo de guerra entre republicanos e a Casa Branca representa grave contratempo para a recuperação econômica global.

    Mais que isso. O apagão do governo dos EUA e a vertigem ante possível calote complicam a contribuição americana ao processo de "reglobalização". O perfil do mercado global nos próximos 20 anos resultará do embate de projetos concorrentes de expansão e influência esquadrinhados por EUA e China, o "G2" do mundo atual.

    Nestes últimos cinco anos, atravessamos uma fase de "desglobalização". O oposto do otimismo que caracterizou a "globalização profunda" do fim da Guerra Fria até a derrocada do Lehman Brothers.

    Seu resultado tem sido a aguda subperformance da economia mundial. Curioso jogo de soma zero. As megaeconomias de EUA e China revisam estratégias e deflagram suas próprias globalizações concorrentes.

    Por um lado, move-se a plenos pulmões a globalização chinesa --cujo lance mais recente é a zona de livre comércio de Xangai. Essa "China 2.0" já investe quase 2% de seu PIB em inovação e converte-se em plataforma de alto valor agregado.

    Em busca de custos mais baixos, empresas chinesas "globalizam-se" ao empurrar suas operações menos nobres para a vizinhança (Indonésia, Malásia e Vietnã) e em direção à África. Lá, os chineses garantem acesso privilegiado a commodities agrícolas e minerais e arrebatam contratos de infraestrutura para suas gigantes da construção civil.

    Ou seja, a China fará com os outros o que nas últimas três décadas os outros fizeram com a China.

    A China também posiciona suas empresas em sócios menores de áreas de livre comércio. É o caso do México no âmbito da Nafta (Área de Livre Comércio da América do Norte). A partir da presença em tais países, os chineses esperam que suas empresas sejam tratadas como locais e assim desfrutem de via privilegiada a grandes mercados como o norte-americano.

    Já a globalização americana representa um movimento de pinça, buscando no Ocidente e Oriente expandir e aprofundar cadeias produtivas globais. O impasse político-fiscal emperra, contudo, as negociações comerciais da Aliança Transatlântica (acordo com a União Europeia) e da Parceria Transpacífico (com alguns países de América Latina, Ásia e Oceania).

    Vale lembrar que a miopia ideológica de Brasil e "bolivarianos" não foi a única sabotagem ao projeto da Alca (Área de Livre Comércio das Américas). Seu mais ferrenho opositor era o lobby conservador no Congresso dos EUA, então encabeçado pelo nacionalista Jesse Helms, conhecido pelo apelidos "Senador Não" e "Mestre-Obstrucionista".

    Na crise de 2008, ficou claro que economia real e setor financeiro viviam em mundos diferentes. Hoje, parece que a terra da fantasia mudou-se de Wall Street para Washington. A contribuição dos EUA ao processo de "reglobalização" nos próximos anos dependerá de mais unidade das forças políticas.

    Caso contrário, os EUA farão com que o mundo se mova em comboio, em que o avanço de todos é dado pelo ritmo do mais lento.

    mt2792@columbia.edu

    marcos troyjo

    Economista, diplomata e cientista social, dirige o BRICLab da Universidade Columbia em NY, onde é professor-adjunto de relações internacionais e políticas públicas. Escreve às quartas.

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