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    Marcos Troyjo

    Brasil e China no túnel do tempo

    24/01/2014 03h00

    Suponha que os 3.000 participantes do Fórum Econômico Mundial entrassem num túnel do tempo. Regressariam até 1971, ano do primeiro encontro de Davos.

    Lá chegando, os CEOs, futurólogos e vencedores do Nobel fariam uma aposta. Que países do que à época se chamava "Terceiro Mundo" –hoje "emergentes"– seriam as estrelas da economia em 2014?

    Imagine que déssemos pistas aos ilustres senhores. Em algum momento entre 2020 e 2023, um entre os emergentes superaria o PIB nominal dos EUA. Contabilizaria volume somado de exportações e importações acima dos US$ 4 trilhões anuais, tornando-se em 2014 a potência comercial líder.

    Seu investimento em pesquisa e inovação rapidamente convergiria à média dos países ricos. Essa nação lideraria em 2013 o ranking da Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI) em número de marcas registradas, patentes e desenho industrial.

    Rivalizaria com os EUA na condição de principal destino de investimentos estrangeiros diretos (IEDs).

    Esse Davos imaginário poderia prever que tal país seria a China?

    No início dos 70, a China não se distinguia pela planta manufatureira. Já o Brasil, no auge do "milagre", era o maior parque industrial do hemisfério Sul. O "Brasil Potência" crescia mais de 10% ao ano.

    Em 1978, China e Brasil tinham PIB equivalente: US$ 200 bilhões. O Brasil contava 100 milhões de habitantes. A China, 1 bilhão. De lá para cá, a população brasileira dobrou. A da China cresceu 30%, já levando em conta a reintegração de Hong Kong (1997) e Macau (1999). Nesse período, nossa economia aumentou 12 vezes. A da China multiplicou-se por 45. Por que a China decolou e o Brasil voou rente ao chão?

    Muitos creditam a diferença do desempenho à mão forte de regimes autoritários e às virtudes do dirigismo. Isso é um equívoco. A China, da Revolução de 1949 até a morte de Mao Tsé-tung, em 1976, também era tenebrosamente ditatorial e planificadora –e sua economia não ia a lugar nenhum.

    O Brasil redemocratizou-se nos 80 e cresceu comparativamente pouco desde então. Mas o problema não é a democracia. A questão é que, com 40 % da renda circulando pelo Estado, o país continua estatizante e dirigista.

    A diferença está no tipo de estratégia adota. A economia chinesa, desde 1978, foi orientada a competir globalmente. Caracterizou-se por parcerias público-privadas, baixo custo trabalhista e tributário, acúmulo de poupança e investimento, atuante diplomacia empresarial.

    Já a vertente brasileira foi voltada para dentro. Ambiente cartorial de negócios, busca de fortalecimento de "campeãs nacionais", política comercial e industrial defensiva, investimento mirrado, seguridade social que não cabe no PIB.

    O túnel que Brasil e China atravessarão para chegar ao futuro é distinto daquele que os trouxe ao presente. Os chineses parecem saber disso. Hoje redirecionam seu modelo industrial-exportador rumo a uma economia em rede mais sofisticada. Será que o Brasil conseguirá fazer o mesmo com seu capitalismo de Estado?

    mt2792@columbia.edu

    marcos troyjo

    Economista, diplomata e cientista social, dirige o BRICLab da Universidade Columbia em NY, onde é professor-adjunto de relações internacionais e políticas públicas. Escreve às quartas.

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