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    Marcos Troyjo

    G7 ou "G-X"?

    10/06/2015 02h33

    Houve definitivamente um certo ar de triunfo em torno da cúpula do G7, conjunto das nações (supostamente) mais industrializadas do mundo, realizada nestes últimos dias na Alemanha.

    Para além da foto de um Obama relaxado num banco a contemplar a loquaz chanceler Merkel no sopé dos Alpes bávaros –evocando em milhões de memes o cenário de 'A Noviça Rebelde'– o grupo pareceu mostrar uma coesão só alcançada nos tempos em que o principal tema da agenda internacional ainda era a Guerra Fria.

    O G7 demonstrou uniformidade no compromisso de estabelecer um cronograma para substituir definitivamente os combustíveis fósseis até o ano 2100. Semelhante identidade de posições serviu para reafirmar a predisposição do grupo em perseverar na imposição de sanções à Rússia de Putin por sua política "vis-à-vis" a Ucrânia. Ainda que gradual e lentamente, a economia dos Sete está se recuperando.

    Será, então, que com a cúpula alemã –realizada numa conjuntura de desaquecimento das economias emergentes–, o G7 firma seu papel de protagonismo no poder global?

    Há muito mais lições a extrair desta última cúpula do G7 do que simplesmente o longínquo compromisso energético-ambiental; a seriedade de propósitos quando o assunto é a postura do Ocidente ante a relação de Putin com sua vizinhança, ou o regozijo na retomada econômica.

    Quanto ao entendimento para descarbonizar a economia até o século 22, não será que muita água passará debaixo da ponte até lá? Valendo-se das lições da história, seria crível estabelecer acordos em 1915 cuja projeção do cumprimento se desse no ano 2000?

    E é necessária uma cúpula do G7 (a primeira que retoma essa denominação desde 1998, ano em que o "G8" se formou a partir da admissão da Rússia, hoje suspensa) para sublinhar o empenho na manutenção de sanções a Moscou?

    Olhada no microscópio, a reunião exibe diversos elementos de uma ordem global fraturada.

    De saída, pode-se afirmar que o G7 perdeu muito de seu peso moral quanto a apresentar, no panorama interno de seus membros, modelos de economia política em que nações emergentes deveriam espelhar-se.

    Os EUA e a irresponsabilidade tanto de agentes financeiros como de chefes de família foram o berço da Grande Recessão de 2008. Na Europa, em 2011, todos tiveram de prender a respiração diante dos efeitos potencialmente devastadores da moratória de dívidas soberanas.

    O Japão, com população economicamente ativa em acentuado declínio, vive praticamente a terceira década de PIB estagnado.

    O Reino Unido, em relação à sua presença como membro da União Europeia, não sabe se casa ou compra uma bicicleta.

    A França encontra-se numa grave crise existencial em torno não apenas das alterações na composição étnica de sua população, mas também pelo malogro das bandeiras estatizantes do Partido Socialista e demais forças de esquerda.

    E será que o Canadá (que, com 35 milhões de habitantes, tem população menor que o Estado de São Paulo) e a Itália (cuja economia em termos reais é hoje menor do que há dez anos) merecem estar no G7?

    No início dos anos 1990, as economias do G7 representavam 70% do PIB global. Países em desenvolvimento, como Brasil, Índia e México, demonstravam grande interesse em se juntar ao grupo.

    Tratava-se mais do que uma simples questão de prestígio. Realmente havia a impressão de que era no âmbito do G7 que se operava a definição das grandes linhas da economia mundial.

    Hoje, o G7 detém fatia de 50% do PIB global. E sua própria centralidade como núcleo de poder é afetada por aquilo de que Stewart Patrick, do Council on Foregn Relations, chama de "G-X".

    É dizer, um mundo "multiplataformas" –em que a governança se encontra diluída pela profusão de instituições e agrupamentos como ONU, FMI, Banco Mundial, Otan, OCDE, OMC, G20, etc— naturalmente reduz o peso relativo do G7.

    A maior questão, no entanto, dá-se no "subterrâneo" dessa multiplicação de entidades que caracteriza o "G-X". E remete mais uma vez ao delineamento das grandes esferas de influência do mundo contemporâneo, irradiadas a partir de Washington e Pequim.

    Afinal de contas, faz sentido tratar de poder num grupo que se entende de elite e alcance universal, como supostamente é o G7, sem incluir a China?

    marcos troyjo

    Economista, diplomata e cientista social, dirige o BRICLab da Universidade Columbia em NY, onde é professor-adjunto de relações internacionais e políticas públicas. Escreve às quartas.

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