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    Marcos Troyjo

    Cúpula do G20 não serviu para nada

    07/09/2016 02h00

    Greg Baker/AFP
    Presidente brasileiro Michel Temer (à esq.) posa ao lado dos líderes dos países do G20, em cúpula na China
    Presidente Michel Temer (à esq.) posa ao lado dos líderes dos países do G20, em cúpula na China

    Reunidos na cidade chinesa de Hangzhou, os líderes das vinte maiores economias do mundo tinham uma grande tarefa à frente. Cabia ao G20 apresentar o "GPS" da recuperação da economia global.

    Não há no mundo tarefa mais urgente -ou abrangente. O PIB mundial caminha a passos lentos desde que a "Grande Recessão" iniciada em 2008 foi instalada.

    Como bem mostra Martin Wolf, do Financial Times, um dos mais influentes colunistas do mundo, a OMC (Organização Mundial do Comércio) tem sua Rodada Doha de liberalização comercial em desalento.

    Os fluxos globais de IEDs (investimentos estrangeiros diretos) estão muito aquém de recentes períodos históricos. A circulação de pessoas apresenta-se mais restrita.

    Todos esse fatores sublinham um argumento que venho defendendo há algum tempo, e cujas linhas gerais estão compiladas em meu último livro "Desglobalização: Crônica de um Mundo em Mudança.

    Há muitas maneiras de descrever a pouca substância que emergiu da Cúpula do G20 na China. Talvez a mais precisa seja aquela que se centra na falta de foco na arena global que cada um dos protagonistas dedicou ao encontro.

    Cada ator mundial predispõe-se a pouca cooperação. O individualismo de cada Estado-Nação está em alta. E tais individualismos, acumulados, levam ao baixo desempenho da economia mundial.

    A coreografia deste G20 assemelhou-se muito à de uma dança das cadeiras. Os movimentos dos que bailam no salão expressam apenas uma conveniência momentânea.

    E, quando a música para, aqueles que conseguem sentar-se não olham para os outros, mas para fora. Os líderes globais podem ter marcado presença em Hangzhou, mas estavam com a cabeça em outro lugar.

    Os EUA foram liderados por um presidente a quem restam alguns poucos meses no Salão Oval. Com os olhos menos voltados para o mundo, os EUA acompanham nervosamente sua mercurial campanha à Casa Branca.

    Em tal conjuntura, ecoava aos ouvidos dos líderes no G20 o vaticínio do candidato republicano Donald Trump: "globalismo, não; americanismo, sim".

    E, talvez num esforço cujo período de validade se restrinja apenas à extensão da corrida presidencial, mesmo Hillary Clinton, há um tempo arquiteta-chefe - na condição de secretária de Estado - do "pivô norte-americano à Ásia, agora mostra-se resistente a um de seus ingredientes centrais - a TPP, Parceria Transpacífico.

    Lançada a luz na Europa como fonte de melhor governança econômica global, tal função mostra-se atrofiada pela incerteza quanto ao desenrolar do brexit. E, para complicar, o calendário eleitoral na França e na Alemanha mostra que forças fragmentárias aos ideais da União Europeia vêm ganhando força.

    Para os emergentes em geral, que no G20 foram não apenas representados por seus membros Brasil, Índia, Rússia, Indonésia, México, Turquia, África do Sul e Argentina, mas também pelos convidados Chade, Egito, Cazaquistão, Laos, Senegal e Tailândia, a cúpula teve mais o formato de um "mutirão" de reuniões bilaterais com a China.

    Aliás, a anfitriã China não disfarça sua estratégia de se mostrar como "líder" do mundo em desenvolvimento. Para tal função, desempenha papel central o desenho de novas instituições de financiamento, como o Banco Asiático de Investimento e Infraestrutura (AIIB, na sigla em inglês), ou o Novo Banco de Desenvolvimento, comumente chamado de "banco dos Brics".

    Mais há muito mais nessa história. A China demonstra relevância cada vez maior como fonte de IEDs ou mesmo empréstimos governo-a-governo. E, nessa linha, o que grande parte dos países, individualmente considerados, têm a apresentar como resultado da reunião do G20, nada mais é do que o anúncio de negócios acordados com a China.

    O caso do Brasil, que anunciou parcerias de investimentos com chineses que chegam a US$ 15 bilhões em setores como siderurgia, energia e infraestrutura, ilustra bem o ponto.

    A mídia chapa-branca chinesa saudou a cúpula do G20 como tendo proporcionado um "consenso histórico sobre o crescimento mundial.

    O único consenso que brotou de Hangzhou, contudo, foi a noção de que a China assumiu de vez sua posição como superpotência do mundo contemporâneo.

    marcos troyjo

    Economista, diplomata e cientista social, dirige o BRICLab da Universidade Columbia em NY, onde é professor-adjunto de relações internacionais e políticas públicas. Escreve às quartas.

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