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    Mariana Lajolo

    Projeto social forma parceiro de Lars Grael na conquista do Mundial

    27/11/2015 02h00

    Um dos principais nomes do esporte brasileiro, vindo de uma família tradicional, em um esporte de elite. Um garoto saído de um projeto social, sem muitas posses. Difícil imaginar suas trajetórias se cruzando. Mais ainda que, um dia, estariam juntos no topo do mundo.

    Lars Grael é membro do clã mais vitorioso da vela nacional. Tem dois bronzes em Olimpíadas. Em 1998, teve seu barco atingido por uma lancha e perdeu a perna direita. A deficiência, porém, não o impediu de continuar a velejar.

    Samuel Gonçalves tinha 13 anos quando, em 2001, os funcionários de uma ONG foram à escola estadual em que estudava, em Niterói (RJ). Queriam apresentar um esporte pouco conhecido dos alunos: a vela. O projeto carregava o nome da principal grife da modalidade no Brasil: Grael. Criado em 1998, já atendeu milhares de alunos e trabalha com iniciação esportiva, profissionalização e educação ambiental. Tem mais de 40 ex-alunos empregados em empresas náuticas.

    Hoje, o grosso do investimento em esporte do governo e das confederações tem ido para o alto rendimento, deixando um vácuo na base. Projetos como o dos Grael ajudam a suprir a lacuna, não só na busca por futuros atletas, mas também no auxílio à formação global de crianças e adolescentes.

    Como Samuel. Para o menino, o encontro com a vela foi amor à primeira vista. No mesmo ano, ele perdeu o pai. A mãe, desempregada, ficou com dois filhos para criar. O esporte o ajudou a se manter de pé.

    A vela é uma modalidade cara, associada à elite, que tem mais facilidade para comprar e manter os equipamentos necessários para sua prática. Samuel nunca possuiu um barco próprio. Se virava como podia: usava embarcações emprestadas, era monitor em cursos, dava aulas e participava de regatas amadoras. Conseguia um apoio aqui, outro ali. Uma academia oferecia treinos de graça, uma loja dava descontos ou doava algumas peças. Mas não tinha nenhum patrocínio. Já dormiu em barcos de amigos por estar sem dinheiro para voltar para casa.

    Os dois caminhos começaram a se cruzar em 2011 quando Lars procurava um parceiro na classe Star. Samuel já era uma realidade, destacava-se em competições e havia se formado pela Universidade Estadual do Rio. O menino empolgado, que chamara a atenção do medalhista olímpico aos 13 anos, podia ser a peça que faltava.

    A primeira experiência, no entanto, foi desastrosa. Um mastro quebrou, e os dois ficaram à deriva perto da ponte Rio-Niterói. Só um tropeço. O único grande desafio para Samuel, na verdade, não foi velejar ao lado de um dos principais nomes da modalidade, mas sim ter de engordar cerca de 20 kg para se tornar proeiro.

    Ter os dois juntos, velejando, já seria uma grande história. Mas o garoto do projeto social e o atleta com deficiência física não queriam ser apenas mais uma dupla a competir. Neste mês, conquistaram o título mundial da Star, o primeiro de ambos –a classe não está no programa da Rio-2016. Se uniram ao seleto grupo que já conta com Torben Grael, campeão em 1990 ao lado de Marcelo Ferreira, e Robert Scheidt, tri com Bruno Prada (2007, 2011 e 2012).

    Nesta semana, Lars lançou sua biografia, "Lars Grael - Um Líder para Nossos Tempos", escrita pelo jornalista Eduardo Ohata. Não deu tempo de esta história entrar. Como outras que virão. Nenhum dos dois tem planos de parar.

    Mariana Lajolo

    Escreveu até setembro de 2016

    Foi repórter e editora-adjunta de "Esporte". Cobriu a Olimpíada de Pequim-2008 e de Londres-2012, os Jogos Pan-Americanos do Rio-2007 e Guadalajara-2011.

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