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    Mariana Lajolo

    A hipocrisia das vaias contra os nadadores russos

    11/08/2016 02h00

    A pergunta foi feita por um jornalista para a nadadora Lilly King que havia dito cobras e lagartos sobre a russa Iulia Efimova e agora dividia com ela o pódio e a mesa de entrevistas após os 100 m peito.

    Lilly acabara de dizer com ar superior que mantinha o que havia dito antes, que Iulia não deveria estar ali porque já havia testado positivo para doping em sua carreira e que sua vitória mostrava que o esporte limpo vale a pena. Não tinha, inclusive, cumprimentado a adversária que havia deixado em segundo lugar na prova.

    Odd Andersen/AFP
    A nadadora russa Iulia Efimova chora ao conseguir medalha de prata na Rio-2016
    A nadadora russa Iulia Efimova chora ao conseguir medalha de prata na Rio-2016

    O jornalista queria saber se ela achava que Justin Gatlin também deveria deixar o time dos EUA. Gatlin é uma das grandes estrelas do atletismo do país. Pode vencer Usain Bolt. Tem no currículo duas punições por uso de substâncias dopantes.

    Deu para perceber que o pensamento de Lilly engasgou. O roteiro do "nós, Team USA, limpos" X "eles, os russos, sujos e malvados" desmorona facilmente. A nadadora disse que achava que qualquer atleta já punido deveria ser barrado, mas não pareceu nada convincente.

    Essa pergunta mostra o tamanho da hipocrisia das vaias aos nadadores russos no Estádio Aquático da Rio-2016. Os norte-americanos que vaiam ignoram os casos positivos e os escândalos que pipocam em seu próprio quintal. Brasileiros que fizeram coro entram numa cruzada pelo esporte limpo seletiva e aplaudem nadadores do país que também já foram flagrados e/ou punidos.

    Iulia recorreu à Corte Arbitral do Esporte para poder nadar a Olimpíada. Ela estava inicialmente fora porque o COI (Comitê Olímpico Internacional) liberou os russos a virem para o Rio, mesmo com os escândalos envolvendo o esporte do país, desde que nunca tivessem tido um teste positivo. Foi uma "suspensão" que ficou pelo meio do caminho.

    Doping na Russia

    Iulia já foi flagrada duas vezes. Na primeira, admite o erro. Na segunda, diz ter sido vítima de contaminação. Já pagou sua pena. Mas continua a aguentar olhares tortos e vaias.

    O mesmo tipo de julgamento acontece com outras atletas. Katinka Hosszu, húngara, três ouros no Rio, convive com as suspeitas de doping. Katie Ledecky, americana, dois ouros no Rio, é um fenômeno.

    A cruzada pelo esporte limpo não pode ter dois pesos e duas medidas e nem ser carregada de preconceitos. Vaiar só quando lhe é conveniente é hipocrisia.

    Chamada - Rio 2016

    Mariana Lajolo

    Escreveu até setembro de 2016

    Foi repórter e editora-adjunta de "Esporte". Cobriu a Olimpíada de Pequim-2008 e de Londres-2012, os Jogos Pan-Americanos do Rio-2007 e Guadalajara-2011.

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