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    Mariliz Pereira Jorge

    Vítima da moda

    06/11/2014 02h50

    Então, é SPFW de novo. E a gente se pega babando em cada roupinha que desfila na passarela. Se eu resolvesse –e pudesse– comprar cada pecinha pela qual me apaixono seria dinheiro suficiente para acabar com a fome mundial. Quero tudo, mesmo com o guarda-roupa abarrotado. Por que a gente é assim?

    Todo verão é a mesma coisa. Faço enxoval quando a temperatura começa a subir. Vou ao shopping como uma noiva que prepara as malas para a lua de mel. Biquíni, saída de praia, shortinho, vestido, colar, anel, brincão, bolsa à prova de areia. Tudo novo. E um par de Havaianas com aquele cheirinho de borracha nova.

    Sempre tem uma moda nova, mas depois de inúmeros micos e de usar muita roupa que não era para mim, aprendi que algumas coisas são apenas para olhar nos outros. Eu sempre babava nas hot pants, mas precisaria de uns 10 centímetros a mais de pernas e uns 10 kg a menos na balança para não fazer feio. Andei namorando um micro short, mas caí na real que só com 10 anos a menos não ficaria parecendo uma dançarina de funk aposentada. Desisti.

    É fácil cair em armadilhas ou aparecer com um visual mais do que datado. A gente vê as fotos do pessoal lindo, descolado, magro e de cabelos de propaganda de xampu, lançando moda e curtindo o verão em Formentera, na Espanha, se acabando no Coachella, na Califórnia, e quer ficar igual. Mas os meses que separam o verão do hemisfério norte do nosso fim de ano tropical muitas vezes deixam as coisas chegarem aqui com cara de déjà vu. Sem falar que eu teria que nascer de novo para ser descolada, magra e com cabelos de propaganda de xampu.

    Não tenho dúvida que já tem gente em nossas latitudes desfilando com as tatuagens temporárias, que ficaram famosas principalmente por causa das Flash Tattoos. Essa marca teve a incrível sacada de criar colares e pulseiras, dourados e prateados para decorar o corpo da mulherada. Fiquei louca quando vi Beyoncé num iate com uma tattoo cintilante em forma de colar. Rica. Agora me imagino na praia lotada, com uma latinha de Skol, tentando fazer a fina, com meu espumante no isoporzinho, rezando para não ser vítima de arrastão. Desisti da tattoo.

    Estava de olho nas pulserinhas de macramê. Pecinha total hip chic que enfeitará os braços de nove em cada 10 meninas. Só porque estão na moda, custarão o triplo do que você pagaria na feirinha - até porque as mais legais não tem na feirinha, apenas nas lojinhas antenadas às tendências. E uma só não basta. Só muitas delas é que dão aquele efeito de 'nem me arrumei, mas sou linda assim mesmo'. Todo mundo vai usar, mesmo custando uma pequena fábula. Vou resistir à pulseirinha.

    A gente quer tanto ficar diferente e acaba igual a um batalhão. A gente quer bancar a exclusiva e acaba cafona e sem personalidade. Mais um cabelo com luzes californianas, mais uma pessoa com uma bolsa colombiana pendurada nos ombros. Vai dizer que você não usou ou no mínimo pensou em usar aquele chapéu de caubói, rústico, na praia? Mais um verão e qualquer lugar do litoral brasileiro pareceria o rodeio de Barretos.

    Agora, a galera linda fica com a mesma cara nas fotos de óculos, porque todo mundo que é chic e antenado usa óculos arredondados e maxi-brinco. Todo mundo fica chic e descolado, e com zero identidade. Me rebelei. Vou apelar para a minha velha coleção de Ray Ban e olhar o verão de um jeito vintage.

    Quase não escapei dos modismos e levei para casa um quimono colorido cheio de franjas. Vai com tudo. Com um shortinho para ir jantar, choppinho com as amigas, e até sobre o biquíni, para emendar um almoço depois da praia. Escolhi, escolhi e quando saí do provador, vi mais duas garotas provando o quê? Quimonos coloridos. Fui embora de mãos abanando.

    Então, li estes dias, que legal mesmo é ser básico. Que básico é in, é cult, é a Giselle fechando o desfile mais disputado da temporada. Esse pessoal da moda deixa a gente louco. Meu guarda-roupa parece um galpão de escola de samba de tão colorido, e querem que a gente seja básico. Sei.

    Acabei de arrumar a mala para uma viagem de 10 dias e tentei colocar as coisas que mais combinam comigo, independentemente se elas são ou não o sopro mais fresco das passarelas. Assim, fica mais fácil não errar, não quero atravessar o verão parecendo uma caricatura de mim mesma. A gente faz dessas coisas. Fechando a mala me dei conta que a peça mais nova é uma bolsa comprada das índias-guaranis, que moram na fronteira do Brasil com a Argentina. Elas são feitas à mão com técnica de crochê. E ninguém mais tem. Só eu. Pelo menos que eu saiba.

    Acho que dá para abrir uma exceção para o quimono.

    mariliz pereira jorge

    É jornalista e roteirista.
    Escreve às quintas e sábados.

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