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    Mariliz Pereira Jorge

    Por que estou solteira?

    01/10/2015 02h00

    Antes de qualquer coisa, quero dizer que se você está feliz solteira, este texto não é para você. Ser solteira é uma circunstância da vida, que pode durar mais, menos, para sempre. Tudo bem e ninguém tem nada a ver com isso.

    Falo com quem se faz essa pergunta regularmente, como eu fiz em alguns momentos. Momentos em que eu não estava namorando, pegando gente ou sozinha por livre e espontânea vontade.

    Vivi fases em que eu não teria sido mais feliz na vida do que aquelas em que estava sozinha e agradecia por poder dormir atravessada na cama. Sem essa coisa de "nós" pra cá, "nós" pra lá. Era eu, uma pizza inteira cheia de cebola, três episódios de True Blood e meia garrafa de vinho. Poucas pessoas me fizeram tão feliz como uma pizza de cebola.

    Mas eu também me questionei muitas vezes por não ter alguém. Perguntei a mim, aos meus amigos, ao tarólogo, à minha mãe, à minha psicóloga. Só desisti de perguntar ao meu pai, que logo me mandava parar com essa mania de querer casar.

    Batia um medinho de terminar a vida, morando em Copacabana, cercada por gatos e sexagenários, de sunga e tênis com meia branca. Eu achava que era hora. Todo mundo estava casando. Cansava de escrever "solteira" na ficha da academia. Ou estava muito frio.

    A minha história é igual a de muita gente. O projeto de ser bem-sucedida, casada e com filhos, aos 35 não passou do primeiro capítulo. O mais perto que a gente chegou de um altar foi para ser madrinha de casamento. Ou de vários.

    Por vontade própria ou por falta de opção, a gente crava um prazo fictício (que quase sempre revela-se cedo demais) para não começar a se desesperar. E depois começa a ficar desesperada.

    Há milhões de mulheres solteiras no mundo. Isso não deveria ser mais um problema, mas é. Algumas se culpam por seus fracassos amorosos, a maior parte culpa o mundo. Nos dois casos é uma puta armadilha. Na maioria das vezes a gente não faz a menor ideia do por que está sozinha.

    E aí começam as desculpas. A gente tem um rosário delas. E elas se tornam verdades absolutas. Ninguém ousa contestar. Sou muito exigente. Não tem homem por aí. Trabalho demais. Não tenho tempo. Sou muito independente. Ninguém quer compromisso.

    Uma a uma, cada desculpa foi criada por uma de nós, que fomos nos convencendo e fazendo outras acreditarem em bobagens que nos protegem de cobranças e frustrações.

    A gente repete essa ladainha sem parar. Não sei quem queremos convencer. A família. Talvez assim parem de me olhar nas festas como se eu fosse uma fracassada. O porteiro. Talvez ele pare de me julgar cada vez que um desconhecido chega de madrugada e só sai depois do almoço. Eu mesma. Talvez eu pare de me cobrar porque a vida é assim.

    É mais fácil ser a vítima da história, se agarrar a clichês e não procurar a verdade que poderia responder a pergunta que você e todas as pessoas que gostam de você (ou que só são escrotas) fazem o tempo todo: por que você ainda está solteira?

    Parei de me enganar quando concluí o seguinte: por que não? Por que não posso estar solteira, se tanta gente está? A gente se convence que é especial e na verdade não é mais especial do que alguém que senta ao seu lado no metrô e que também está sozinho.

    Então, pare para pensar. Será que essas desculpas não são apenas desculpas? E todas as pessoas que estão se casando? E todos os seus amigos que têm alguém? Nunca se casou tanto no Brasil, o que também derruba a crença de que ninguém quer compromisso.

    Há outros fatores que minam as suas esperanças de encontrar o amor e talvez você não se dê conta disso. A gente precisa encarar que cada vez mais muita gente vai passar pela vida sem encontrar o grande amor.

    Talvez você esteja tão obcecada e nem perceba que, sim, tem parte da culpa por continuar solteira, mas não porque você não é bonita o suficiente, interessante o suficiente, gostosa o suficiente.

    A dificuldade de encontrar um grande amor é a única verdade de todos esses fantasmas que rondam a vida de solteiro. É difícil pra caceta. É preciso muito empenho, disposição e um bocado de sorte. Mas eu diria que empenho é o mais importante. Quem se dispõe a entrar no jogo sem medo de ter que, uma vez ou outra, andar algumas casas para trás, tem mais chance sempre.

    Antes de se apoiar nessa bobagem de que não tem homem, de que é independente demais, que não tem tempo, analise como você vive, como se relaciona. Tem mulher que se isola, tem medo de intimidade, tem baixa autoestima, se mete em relações erradas, e tem as chatas mesmo, mas nem isso é problema para algumas delas. Conheço várias chatas que estão felizes infernizando a vida de algum pobre.

    Talvez você descubra que você é sua grande desculpa. Descobri que o meu problema era ser feliz demais comigo mesma, apesar de querer muito ter alguém. Então, eu namorava caras errados, insistia em relações de merda, sofria muito para provar para mim mesma que era muito melhor ser solteira.

    Me convenci que todos os relacionamentos tinham começo, meio e fim. Que em algum ponto a coisa invariavelmente iria desandar. Até que conheci alguém que foi derrubando todas as minhas desculpas.

    Olhando para trás vejo que teria sofrido menos se soubesse que a resposta para a pergunta "por que estou solteira?" é muito simples: porque faz parte da vida, de crescer, amadurecer. E talvez a gente só esteja pronta para encontrar a pessoa certa quando deixar de arranjar desculpas e parar de se perguntar.

    mariliz pereira jorge

    É jornalista e roteirista.
    Escreve às quintas e sábados.

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