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    Mariliz Pereira Jorge

    Tá tranquilo, tá favorável

    13/02/2016 02h00

    Agora que o prefeito do Rio, Eduardo Paes, afirmou pela segunda vez em duas semanas que o vírus da zika não deve ser tratado como "tema olímpico" podemos respirar aliviados. Afinal, o prefeito, a autoridade máxima da cidade, aquele que zela pelo bem-estar dos moradores e dos visitantes, falou.

    E se ele falou, está falado e garantido.

    "Tá tranquilo, tá favorável", diz um dos hits do Carnaval. Deve ser o que passa na cabeça dos governantes ao dizerem essas baboseiras, quando o cenário mostra o contrário.

    Hoje, acontece uma força-tarefa em todo o país que envolverá 220 mil membros das Forças Armadas na busca e eliminação de criadouros. Seria tão mais honesto se o prefeito assumisse que o momento é delicado e que há muito a ser feito para que essa epidemia esteja controlada até os Jogos.

    Há duas semanas, escrevi aqui que a imprensa mundial havia acordado para o assunto. Desde então, não há um dia que o tema não esteja nos principais jornais. Fala-se de tudo, inclusive em boicote. Não é momento para posar de malandrão e dizer que está tudo bem, sem que, de fato, esteja.

    É acintosa a atitude de minimizar os problemas quando confrontados com eles. O mesmo Eduardo Paes disse recentemente que o problema da poluição da baía da Guanabara "não é um tema olímpico".

    Parece que nada é problema para o prefeito. Enquanto isso, o Exército teve que ser chamado para matar mosquito. Enquanto isso, o ex-dirigente da Federação Internacional de Vela Peter Sowrey disse ter sido demitido do cargo por insistir em levar a competição para a cidade de Búzios, na região dos Lagos.

    Claro que haverá Olimpíada. Claro que os atletas vêm. Muito provável que o evento seja um sucesso.

    A não ser que a situação não seja controlada até agosto, a chance é mínima de que qualquer atleta desista de participar dos Jogos, mesmo com essa ameaça pairando literalmente no ar.

    A Olimpíada é o principal evento esportivo do mundo, que reúne apenas a elite. Atletas se preparam durante anos para esse momento. Abrir mão da Rio-2016 significa esperar mais quatro anos para tentar uma medalha no olimpo esportivo.

    Muitos simplesmente não têm esse tempo. Alguns estão no auge de suas formas, mas em quatro anos podem até mesmo estar aposentados. Perder a competição é abrir mão da chance de escrever seu nome na história. Apenas participar de uma Olimpíada deve ser uma experiência única.

    É provável que a grande maioria dos atletas esteja disposto a correr os riscos necessários. Seja de ser contaminado pelo Aedes aegypti ou de velejar em uma baía de águas poluídas.

    A Olimpíada está servindo para mostrar ao mundo todas as fragilidades das políticas públicas e toda a incompetência dos governantes brasileiros. A seis meses dos Jogos, o que era para ser notícia acaba eclipsado pelas barbeiragens as quais o brasileiro está, infelizmente, acostumado a conviver.

    O zika, a baía poluída, a violência, a falência da saúde podem não vir a ser um grande problema durante a Olimpíada. Então, todo mundo vai embora e ficamos nós com os abacaxis. Problemas é o que não nos faltam, com Olimpíada ou sem, mas na cabeça de nossos governantes tá tranquilo, tá favorável.

    mariliz pereira jorge

    É jornalista e roteirista.
    Escreve às quintas e sábados.

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