Tirando uns dois amigos que trabalham na organização dos Jogos, mais meia dúzia que vive no meio esportivo e minha irmã que foi até a Esplanada dos Ministérios e diz ter se emocionado, a repercussão da chegada da tocha olímpica em Brasília foi um retumbante fiasco.
O que é uma pena, mas compreensível, levando em conta que os assuntos da semana foram a discussão na comissão do Senado sobre o impeachment da presidente Dilma Roussef, mais o afastamento do presidente da Câmara Eduardo Cunha. Que momento oportuno. Não há dúvida de que o esporte preferido dos brasileiros hoje é a política.
Em segundo, mas a léguas de distância vem o futebol, que também acabou eclipsado pelas notícias de Brasília. O Corinthians acaba de ser desclassificado da Libertadores e eu não li nenhum "chupa" na minha timeline, não teve "chora, gambá" gritado pela janela. Saudade da zoeira saudável. Da época em que não havia campeonato entre Petralhas e Coxinhas para atrapalhar.
Percebe como é fácil enveredar por outros temas? O assunto era a chegada da tocha olímpica. A expectativa de que trouxesse junto com ela o ânimo que falta ao brasileiro para entrar no clima dos Jogos não se concretizou.
Rahel Patrasso/Xinhua | ||
Presidente Dilma Rousseff acende tocha olímpica no Palácio do Planalto, em Brasília |
Pelo contrário, apenas comprova os dados colhidos pela Hello Research, agência de pesquisa e inteligência de mercado, sobre o evento. O brasileiro perdeu o pouco ânimo que tinha. Se a 500 dias dos Jogos, 34% das pessoas entrevistadas diziam ter interesse pela Olimpíada, a segunda pesquisa, feita recentemente, mostrou que esse número caiu para 24%.
Dilma disse na cerimônia da tocha que o momento extremamente crítico de nossa democracia não atrapalhará os Jogos. Difícil atrapalhar mais, já atrapalhou tudo o que poderia.
Uma nova batelada de dados deve ser divulgada pela agência de pesquisa, em julho, mas nem o mais Pollyanna dos otimistas deve acreditar que o panorama será diferente. Ao menos há mais gente que sabe que a Olimpíada será realizada no Rio. São 75% contra 52% da pesquisa anterior. O que é alarmante, se pensarmos que o assunto é pauta dos últimos seis anos.
Como tudo que é ruim sempre pode ficar pior, só dois entre dez brasileiros soube dizer o nome de um atleta olímpico. O mais lembrado, com 9% das menções, foi Cesar Cielo, que nem fará parte da delegação.
O motivo para tanto desânimo tem um nome, descrença. As pessoas não acreditam que um evento desse trará benefícios para o país, reflexo do legado da Copa do Mundo –ou da falta dele.
Estádios nababescos às moscas, aeroportos que nunca ficaram prontos. Alguém lembra da promessa do trem bala? Gastou-se uma exorbitância, fizemos a melhor Copa de todos os tempos, mas o país continua num eterno 7 a 1.
Para 75% dos entrevistados, a única certeza é que haverá desvio de verba pública. Em tempos que a palavra propina é mais repetida na TV do que Olimpíada, quem tem coragem de discordar?
De todas as ações feitas até agora, o revezamento da tocha, que passará por mais de 300 cidades, é o que pode aproximar mais a população dos Jogos e talvez uma parcela dessas pessoas seja mordida pelo mosquito do espírito olímpico, aquele que não tem nada a ver com o Aedes aegypt.