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    Mariliz Pereira Jorge

    Que vençam os mais fracos

    14/10/2017 02h00

    Henry Romero/Reuters
    Messi comemora seu gol na vitória da Argentina sobre o Equador, pela última rodada das eliminatórias sul-americanas
    Messi comemora seu gol na vitória da Argentina sobre o Equador, pela última rodada das eliminatórias sul-americanas

    Percebo alívio entre meus colegas porque a Copa de 2018 não se privará da presença de Messi, que salvou a Argentina de um "vexame histórico". Também não vejo graça numa competição que pretende reunir os melhores times, mas deixa fora um dos donos da bola no cenário atual.

    No entanto, a imagem da semana, aquela que ficará para sempre na minha memória é a da classificação do Panamá, que vai participar pela primeira vez de uma Copa. Jogador, torcedor e policial, abraçados no meio do campo, é de derreter o coração mais peludo.

    Não era para menos. O país tentava uma vaga desde 1978, e agora vai. Que comoção. Milhares de pessoas foram às ruas da capital para celebrar depois da vitória sobre a Costa Rica, e no dia seguinte o presidente Juan Carlos Varela declarou feriado nacional. Nada de trabalho ou de aulas. Naquele dia o Panamá ganhou, de certa forma, a Copa do Mundo.

    E olha o tamanho da coincidência. É justamente dos jogos da Costa Rica que eu guardo algumas das melhores lembranças do Mundial de 2014. Lembro de ter torcido mais pelos costarriquenhos do que em qualquer jogo da nossa seleção.

    Era pelo inusitado, pela garra, mas principalmente pelo prazer de torcer por um time que foi garantia de diversão sem o sofrimento imposto pelo time que nos representava.

    A Costa Rica é daqueles azarões que aparecem, conquistam a torcida com bom futebol, gols, vitórias e acabam avançando mais do que o esperado. A história das Copas está cheia de casos assim.

    Mas por que temos essa tendência de torcer pelos mais fracos? Na verdade, isso nada tem a ver com empatia ou altruísmo. É um baita egoísmo o que move nosso espírito hedonista, uma característica do comportamento, estudada pelos economistas Jimmi Frazier e Elton Snyder, no começo dos anos 1990, e que foi batizada por eles de "economia emocional".

    É uma conta simples feita de forma inconsciente. Quando o time para o qual torcemos não está envolvido, escolhemos aquele que vai nos garantir mais diversão e emoção. E quando esses sentimentos são inesperados, no caso de um azarão, a percepção de que tudo é mais intenso do que quando torcemos por um time ou um atleta favoritos.

    Ver Messi jogar é prazeroso, mas acaba sendo uma emoção calculada. Você sabe, já espera, que o desempenho seja fenomenal, não se surpreende mesmo em seus melhores dias.

    Mas pegue um time como o da Islândia, um grande azarão na Eurocopa, em 2016, que chegou às quartas de final, depois de eliminar a Inglaterra. O time virou uma atração, conquistou fãs de outros países, não só pelo futebol, mas pela simpatia de sua torcida que fazia uma coreografia ensaiada. Impossível não torcer por eles.

    Não é sobre futebol, mas sobre prazer. E era mais divertido torcer sem compromisso pelo fator surpresa Islândia do que por qualquer outro time da elite do esporte.

    Isso serve na Copa, na Olimpíada, na Dança dos Famosos.

    A preocupação agora da imprensa especializada é de que a Itália consiga se salvar para garantir que os oito campeões mundiais carimbem o passaporte para a Rússia. O tipo de angústia que atormenta, com razão, os puristas, mas não faz muita diferença para torcedor que vai acompanhar a Copa pela bagunça.

    Da minha parte, desejo, por puro egoísmo e desejo de muita diversão, que vençam os mais fracos.

    mariliz pereira jorge

    É jornalista e roteirista.
    Escreve às quintas e sábados.

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