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    Matias Spektor

    Dilma vai à Casa Branca

    06/02/2012 07h00

    Faltam apenas dois meses para a visita oficial de Dilma aos Estados Unidos.

    A nova correlação de forças entre os dois países é benéfica para o Brasil. Empresas como Coteminas, Braskem, JBS, Gerdau e Embraer viraram grandes investidoras por lá, ao passo que o país se transformou no quarto credor global dos Estados Unidos e num enorme mercado consumidor de produtos americanos.

    A relativa ascensão brasileira --e o relativo declínio americano-- estão transformando a dinâmica bilateral. Agora, o desafio da política externa brasileira é desenvolver os instrumentos para tirar vantagens dessa nova constelação.

    O trabalho pela frente é enorme. Em perspectiva comparada, nossa embaixada em Washington é pequena e carente de recursos. Dentre os grandes emergentes, o Brasil é o único que não tem uma estratégia agressiva de marketing para promover sua imagem na sociedade americana. Tampouco instrumentaliza os quase dois milhões de brasileiros que lá moram, um recurso de poder inexplorado.

    Mais surpreendente ainda é o fato de não termos uma política eficaz para ganhar a simpatia dos deputados e senadores no congresso americano. São eles que têm jurisdição exclusiva sobre os temas mais sensíveis do dia a dia --algodão, etanol, preferências comerciais e isenção de vistos. Em temas como suco de laranja e carne bovina, eles não mandam, mas influem. Em questões diplomáticas, eles ditam o tom.

    Enquanto isso, continuamos sem acordos para evitar a dupla tributação, proteger investimentos ou regular compras no aquecido mercado de defesa.

    Dilma não vai transformar essa situação da noite para o dia. Seu desafio nesta viagem é mais modesto: desfazer o mal-estar causado pela intervenção na Líbia, a crise na Síria e a retaliação brasileira à Comissão Interamericana de Direitos Humanos no episódio de Belo Monte. Ela também buscará obter da Casa Branca a mensagem inequívoca de que a ascensão do Brasil é benéfica para os Estados Unidos. Obama e Hillary Clinton precisam repetir isso porque não é o que se ouve nos ambientes que moldam o discurso público americano, como a imprensa, as agências governamentais, a academia e os centros de pensamento (think-tanks).

    Como lidar com esse desafio durante a visita presidencial? O passado revela que os Estados Unidos respeitam o Brasil quando sua mensagem, geralmente crítica, vem acompanhada de propostas concretas.

    Por isso, Dilma ganhará se for capaz de adotar um tom propositivo. Ela pode discutir temas nos quais o Brasil nem sempre concorda com os Estados Unidos, mas para os quais tem sugestões práticas que, se bem postas, elevariam a qualidade do dialogo bilateral: a crise econômica na Europa, os riscos de uma intervenção na Síria, o perigo de uma guerra no Irã e o iminente descompasso entre os dois países durante Rio+20, a conferência conferência sobre desenvolvimento sustentável da qual seremos sede daqui a cinco meses.

    Eu passo boa parte da minha vida profissional analisando documentos empoeirados sobre conversas ocorridas num passado distante no Salão Oval. Nunca deixo de me surpreender com a timidez relativa dos mandatários brasileiros e sua hesitação em travar conversas com os presidentes americanos sem constrangimento. Outros países com recursos de poder similares aos nossos são mais assertivos. Essa atitude acanhada é um tiro no próprio pé.

    Hoje, temos mais força para conversar com os Estados Unidos que em qualquer momento da história. Em sua passagem por Washington, Dilma tem a chance de inventar uma nova equação.

    matias spektor

    É doutor pela Universidade de Oxford e ensina relações internacionais na FGV. Escreve às quintas.

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