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    Matias Spektor

    A política externa de 2013

    25/12/2013 03h00

    Duas imagens marcaram a posição do Brasil no mundo no ano que se encerra: a onda de manifestações populares e o Cristo Redentor em voo desgovernado na capa da revista "The Economist".

    Juntas, as cenas revelam rachaduras no consenso nacional que o lulismo costurou durante os últimos dez anos, animando a disputa pelo modelo econômico e social da próxima década.

    Vistas em perspectiva internacional, essas imagens golpeiam a ideia de país emergente, a marca registrada do Brasil de Lula.

    O processo de ascensão internacional do país sofreu dificuldades adicionais.

    A crise da espionagem foi uma delas. Diante das revelações, o Planalto suspendeu a visita aos Estados Unidos e introduziu o tema na Organização das Nações Unidas.

    Em ambos os casos, agiu com competência.

    No entanto, a crise não pôde ser aproveitada em benefício próprio. Enquanto os alemães utilizaram o estardalhaço para negociar melhores condições com os norte-americanos, nós suspendemos todos os canais de comunicação.

    Não por ideologia, mas porque o governo carece de recursos materiais e humanos mínimos para sustentar com efeito um diálogo bilateral dessa natureza.

    Outro problema foi a crise do Itamaraty, instituição que atravessou um ano horrível.

    A fuga do senador boliviano evidenciou problemas de gestão em um ministério que dobrou seu número de diplomatas e expandiu sua rede no exterior, mas continua operando com os métodos de casa pequena.

    Nos últimos 12 meses, o ministério ainda foi alvo de uma bateria de denúncias –megassalários, funcionários-fantasmas e assédio contra oficiais de chancelaria.

    Sem estratégia de comunicação e aferrado a modos antiquados de relacionamento com a imprensa, apanhou em praça pública.

    O Itamaraty também sofreu um baita aperto orçamentário, dificultando a operação dos postos e levando à suspensão de viagens e iniciativa internacionais.

    É instrutivo observar a trajetória do ministério no empurra típico da Esplanada.

    A principal iniciativa diplomática do ano –a exitosa campanha pela direção geral da Organização Mundial do Comércio– foi conduzida sob a batuta do Planalto e do Ministério do Desenvolvimento.

    Todos se perguntam se o novo chanceler terá condições de reverter a situação.

    Como não gera votos nem dinheiro, o Itamaraty depende de três bens intangíveis para operar direito: o apoio inconteste da Presidência da República, acesso aos parlamentares que facilitam o orçamento e boa reputação junto à opinião pública.

    Em 2014, a conjuntura eleitoral impossibilitará jogadas audaciosas em diplomacia. Pelo menos antes de novembro.

    Mas isso pode ser uma vantagem. A radicalização do embate político que se aproxima talvez ofereça a cobertura necessária para tocar o processo de reforma.

    Resta torcer para que os ajustes venham logo. Afinal, turbulências internas e externas ao processo de ascensão acabaram de começar.

    matias spektor

    É doutor pela Universidade de Oxford e ensina relações internacionais na FGV. Escreve às quintas.

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