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    Matias Spektor

    Presidente Dilma vai procurar Condoleezza mais uma vez

    26/06/2015 08h55

    Na próxima quarta, dia 1º, Dilma almoçará na Califórnia com Condoleezza Rice.

    Da última vez que se encontraram, há quatro anos, a presidente interrompeu o jantar que dividiam para fazer um gesto inusual: "Condoleezza, quero agradecer muito o apoio que você deu ao governo do presidente Lula".

    Condoleezza fora assessora de segurança nacional e secretaria de Estado de George W. Bush. Ao lado do presidente, tivera papel central na decisão de ir à guerra no Iraque e no Afeganistão.

    Entretanto, Dilma tinha bons motivos para agradecer.

    Quando o PT foi eleito à Presidência, em 2002, o governo americano ficou dividido: uma ala do partido Republicano enxergava em Lula uma ameaça, enquanto outra ala estava disposta a dar ao futuro ocupante do Planalto o benefício da dúvida.

    Quem dirimiu a questão foi Condoleezza, redobrando a aposta em Lula e tranquilizando a base republicana.

    Ela defendia a tese segundo a qual Lula fora eleito num pleito limpo e se comprometera com os princípios de mercado; portanto, Bush devia estender-lhe a mão.

    No entanto, ela tinha consciência de quão difícil seria montar uma parceria entre a direita americana e a esquerda brasileira. Na ocasião, disse a Bush: "Presidente, o Brasil vai demandar um trabalho diplomático cuidadoso e persistente".

    O principal desafio dela era encontrar um interlocutor em Brasília. Sem alguém capaz de funcionar como referência do lado brasileiro, a parceria entre os dois governos jamais decolaria.

    À época, quem cumpriu essa função foi o ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu.

    Condoleezza precisava de Dirceu porque queria evitar a formalidade artificial que transforma a relação entre dois países numa interposição de dois monólogos.

    Condoleezza e Dirceu conseguiram fazer a parceria avançar, sem com isso demandar concordância plena. Ao contrário, discordaram sobre quase tudo. Mas o desacordo era às claras, evitando surpresas e mantendo o foco nas áreas de coincidência.

    Lula e Bush imitaram o estilo direto dos assessores. Quando Condoleezza publicou artigo denunciando os abusos de Hugo Chávez, Lula telefonou para Bush para reclamar. "Se vocês querem tranquilidade na Venezuela", disse Lula a Bush, "estou disposto a ajudar. Agora, a cada vez que a Condoleezza bate no Chávez, ele tem um bom pretexto para fazer uma passeata contra vocês!" Os artigos dela cessaram.

    Semana que vem, na Califórnia, Dilma terá a oportunidade de refletir sobre aquele passado recente.

    A presidente poderá concluir que a guinada esperada na relação com os EUA neste segundo mandato, se for mesmo acontecer, demandará que Planalto e Casa Branca identifiquem uma dupla com a autoridade necessária para discutir e negociar.

    matias spektor

    É doutor pela Universidade de Oxford e ensina relações internacionais na FGV. Escreve às quintas.

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