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    Matias Spektor

    Visita presidencial à Nasa poderá reviver política espacial

    01/07/2015 03h00

    O programa espacial brasileiro nasceu com apoio americano.

    A Nasa treinou engenheiros, vendeu equipamentos e transferiu tecnologia de propulsão e combustível de foguetes, além de prestar cooperação na área de testes meteorológicos.

    Tudo degringolou a partir de 1977, quando o Brasil lançou um programa próprio de construção de foguetes que, na opinião do Pentágono, poderia ser desviado para a montagem de mísseis.

    Não ajudou o fato de o Brasil assinar contratos de produção de satélites de reconhecimento militar e de mísseis com o governo de Saddam Hussein, no Iraque.

    Os americanos impuseram sanções comerciais e pressionaram França e Rússia a suspender a cooperação já contratada. As autoridades brasileiras responderam à pressão buscando cooperação chinesa para o lançamento de satélites e investindo na construção de um veículo lançador de satélites (VLS).

    Axel Bugge/Reuters
    Veículo Lançador de Satélite (VLS) no centro de lançamentos de Alcântara, no Maranhão
    Veículo Lançador de Satélite (VLS) no centro de lançamentos de Alcântara, no Maranhão

    O programa espacial, porém, nunca saiu do chão. As três tentativas de pôr um VLS em órbita falharam. A última cobrou 21 vidas em 2003.

    Há mais de 20 anos sabe-se que a solução para o problema passa por cooperação com os Estados Unidos.

    Para isso, o Brasil tem um grande ativo: a base de lançamentos de Alcântara, no Maranhão, que pode ser arrendada em troca de receitas necessárias para tirar nosso programa espacial do papel.

    Para viabilizar esse projeto, no entanto, é necessário um acordo de salvaguardas com os Estados Unidos, que dominam o mercado global de lançamentos.

    FHC tentou fazê-lo. No início, suas conversas com os americanos foram duras.

    Eles demandavam que o Brasil negasse contratos a países não signatários de um regime de controle de mísseis, o que beneficiaria companhias americanas como Boeing e Lockheed Martin. Pediam ainda que o país abdicasse de construir seu próprio VLS.

    O governo americano também pretendia negar o acesso de autoridades brasileiras às cargas de seus lançadores.

    A política externa brasileira mobilizou alguns de seus melhores quadros para virar a mesa.

    Em 2000, depois de muita luta, as negociações chegaram a bom termo: o Brasil autolimitaria seu acesso aos lançadores americanos, mas desenvolveria um VLS próprio e manteria o direito de autorizar (ou não) cada lançamento solicitado pelos Estados Unidos.

    Quando o acordo veio a público, porém, o deputado do PT da Bahia Waldir Pires lançou uma ofensiva.

    Denunciando o texto como "entreguistas", ocupou as capas de revistas e jornais, mobilizando parlamentares de todo o espectro político, inclusive alguns da base tucana.

    De lá para cá, o Brasil tentou reviver Alcântara em parceria com a Ucrânia, plano para o qual o Congresso aprovou acordo idêntico àquele negociado com os americanos. Mas o projeto definhou porque não há mercado viável de lançamentos sem acordo geral com os americanos.

    Hoje, todos sabem que o futuro do programa espacial brasileiro depende de um acordo entre Brasília e Washington.

    Agora que Dilma restaurou o diálogo, é hora de começar uma nova negociação.

    matias spektor

    É doutor pela Universidade de Oxford e ensina relações internacionais na FGV. Escreve às quintas.

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