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    Matias Spektor

    Consenso novo

    22/10/2015 02h00

    Um novo consenso ganha força entre as candidaturas presidenciais de Hillary Clinton, Marco Rubio e Jeb Bush.

    Segundo a perspectiva emergente, Obama seria responsável por um perigoso vácuo de liderança americana no mundo. Fraco e hesitante, o presidente teria patinado na condução das relações internacionais. Em vez de liderar o chamado mundo livre com vigor, andaria a reboque dos eventos.

    O problema é a Síria. Lá, Obama teria protelado de forma irresponsável a decisão a respeito de uma eventual intervenção militar. Em vez de alavancar a superioridade militar americana para pôr o regime Assad na defensiva, ele teria se acovardado, temendo um desastre análogo ao das últimas incursões americanas no Iraque e no Afeganistão.

    Segundo essa versão da história, a inépcia da Casa Branca estaria revertendo o equilíbrio de poder no Oriente Médio: por causa do declínio americano, Putin estaria galgando posições em toda a região.

    A irritação com o estilo reflexivo de Obama é palpável. "Há coisas que não dá para ficar discutindo", diz um assessor de Jeb Bush. "Tem de fazer."

    Essas ideias fazem parte de uma guinada cultural mais ampla em Washington. Sua melhor ilustração é a recém-lançada biografia de Henry Kissinger, escrita pelo historiador Niall Ferguson.

    Diplomata-mor dos Estados Unidos entre 1969 e 1976, Kissinger foi uma das personagens mais influentes da Guerra Fria. Ele carrega alguns crimes e muita coisa ruim nas costas, de Camboja a Laos, do Vietnã a Timor Leste, de Bangladesh ao Chile e à Argentina. Mas Ferguson oferece uma visão fundamentalmente positiva nesse best-seller.

    Qual a principal virtude desse estadista? A capacidade de tomar decisões com firmeza, mesmo quando os efeitos de sua ação permanecem desconhecidos. É do próprio Kissinger a tese segundo a qual demonstrações de força, por si sós, geram poder e autoridade para o país que as promove.

    O resultado disso, claro, é o uso indiscriminado da violência, como ocorreu quando Kissinger esteve à frente da guerra do Vietnã.

    Ferguson foi grande defensor da diplomacia de George W. Bush. Em seu livro sobre Kissinger, ajuda a justificar as palavras do ex-vice presidente Dick Cheney a respeito do Iraque: "Se passarmos o tempo debatendo o que aconteceu 11 ou 12 anos atrás, terminaremos ignorando as ameaças de hoje". Dessa perspectiva, pouco importa que a intervenção americana no Iraque tenha causado o fenômeno do Estado Islâmico.

    Se esse consenso a respeito do governo Obama pegar, o mundo deve se preparar para uma diplomacia americana mais assertiva e possivelmente mais violenta.

    matias spektor

    É doutor pela Universidade de Oxford e ensina relações internacionais na FGV. Escreve às quintas.

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