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    Matias Spektor

    Brasil contra o terror

    04/02/2016 02h00

    Os países do centro do sistema financeiro internacional aprovaram novas legislações contra o financiamento ao terrorismo. Como o Brasil carece de leis específicas, o Ministério da Fazenda teme isolamento e dificuldades adicionais para o ajuste fiscal. Foi no intuito de resolver essa pendência que o governo propôs um projeto de lei antiterrorismo.

    O PT recusou-se a assumir a relatoria do projeto no Congresso, levando Dilma a uma dobradinha com a liderança da oposição no Senado. O projeto chegou ao Parlamento com pedido de urgência, travando a pauta com vistas a ganhar passagem célere, sem discussão detalhada ou contraditório.

    No vaivém parlamentar, quem tomou a dianteira no processo foi a Câmara dos Deputados, cuja versão do texto ganha força e deve ser aprovada nas próximas semanas. A Fazenda está satisfeita, mas se trata de uma peça estapafúrdia com impacto negativo para a vida pública no país.

    O projeto abre brecha para a criminalização de protestos e manifestações. Um juiz poderá declarar terroristas os estudantes que ocupam escolas. Ou poderá enquadrar como terrorista o presidente do sindicato dos taxistas que incita a violência física contra motoristas e passageiros do Uber.

    Isso ocorre porque a tipificação dos atos terroristas no projeto é tão vaga quanto abrangente, introduzindo vasto leque de "atos preparatórios de terrorismo". Para especialistas, a salvaguarda formal contra eventuais abusos foi mal feita. Em vez de disciplinar os órgãos de segurança e inteligência, o projeto outorga a eles poderes adicionais de vigilância, sem contrapartidas de controle externo. Diz-se que a Polícia Federal fez campanha eficaz.

    Os membros do governo com algum apreço pelos direitos humanos sabem disso. No entanto, fazem vista grossa ou tentam defender o indefensável. Na Casa Civil, um alto funcionário afirma que os movimentos sociais estariam apoiando o projeto de lei, uma inverdade.

    No Ministério da Justiça há quem defenda o texto como medida preventiva contra um hipotético ataque terrorista durante a Olimpíada. Balela: leis antiterrorismo nunca evitaram ataques brutais na Europa ou no Oriente Médio. Houvesse preocupação real pelo torneio, o governo não teria suspendido a necessidade de visto para turistas de Austrália, Canadá, EUA e Japão.

    À cidadania restará dar batalha no Supremo Tribunal Federal, mas boa parte dessa operação demandará intenso trabalho no exterior.

    Há três frentes principais. Os relatores especiais da ONU para questões de direitos humanos e liberdades fundamentais. A Corte Interamericana de Direitos Humanos. E as redes transnacionais de ativistas que vivem dramas similares no Chile e na Argentina.

    A boa luta está por começar.

    matias spektor

    É doutor pela Universidade de Oxford e ensina relações internacionais na FGV. Escreve às quintas.

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