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    Matias Spektor

    Imagem externa

    11/02/2016 02h00

    Em 30 anos de democracia, o Brasil enfrentou duas crises pontuais de imagem externa: a chacina da Candelária de 1993 e as revelações do petrolão.

    O fato de estarmos no epicentro da epidemia global do vírus zika representa a terceira crise dessa natureza. O tema contagia o comentário internacional sobre o Brasil no momento em que os Jogos Olímpicos garantem a mais intensa cobertura de imprensa estrangeira na história do país.

    A epidemia da zika afeta a posição do Brasil no mundo porque revela as dimensões de nosso horror cotidiano. Mostra que a sétima economia do planeta ainda é incapaz de prover saneamento básico a quase metade de sua população e, assim, continua à mercê de um mosquito que há décadas faz milhares de vítimas por doenças as mais variadas.

    Essa crise de imagem, porém, é mais grave do que as outras, e não apenas pelo drama que representa a microcefalia. Um problema é que há governos estrangeiros em alerta, cujas decisões dependem da credibilidade dos compromissos brasileiros na matéria.

    Outro problema é o risco de sensacionalismo. Já se ouve político estrangeiro denunciar turistas brasileiros como potenciais ameaças. Já se sabe que comitês olímpicos mundo afora avaliam os riscos enfrentados por atletas durante as jornadas do Rio. A cobertura das principais redes globais de televisão é a que mais preocupa.

    Se o sensacionalismo tomar conta lá fora, será difícil encontrar soluções inteligentes ao problema aqui dentro.

    Quais soluções? Aquelas capazes de pôr o saneamento no centro da agenda de obras de infraestrutura do governo. Ou aquelas capazes de oferecer a mulheres grávidas sem plano privado de saúde a garantia de diagnósticos rápidos.

    Se ganhar terreno, o sensacionalismo também poderá atrapalhar o necessário debate nacional sobre a prática do aborto num país onde mulher rica tem autonomia sobre o próprio corpo, mas a pobre, não.

    O sensacionalismo ainda dificultará o debate sobre o futuro de institutos de ponta tais como Butantã, Chagas, Pasteur e Fiocruz, neste momento de vacas magras para a ciência brasileira.

    Combater a crise de imagem externa com uma estratégia de comunicação concebida como tal é parte da própria luta contra o vírus.

    O Planalto, porém, ainda não esboçou uma campanha global nem incluiu o Itamaraty em seu comitê de crise.

    Quem deu o exemplo semana passada foi o embaixador do Brasil em Washington. Em artigo para a imprensa americana despido do burocratês que tanto atrapalha a diplomacia pública brasileira, ele indicou o caminho das pedras. É só seguir a pista.

    matias spektor

    É doutor pela Universidade de Oxford e ensina relações internacionais na FGV. Escreve às quintas.

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