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    Matias Spektor

    100 horas de Temer

    14/04/2016 02h00

    Michel Temer é sagaz. Sua estratégia produziu um resultado formidável em poucos meses de trabalho: a sobrevida política de Dilma encontra-se ameaçada.

    No exato momento em que a Câmara dos Deputados define o futuro da Presidência da República, quem ocupa o primeiro lugar da linha sucessória é um dos homens públicos com mais vivência nas artimanhas do Parlamento.

    Temer também tem sorte. Dilma desconhece o Congresso do qual agora depende, preside uma economia recessiva e é responsável por equívocos grosseiros de condução política. A maioria de seus eleitores a desertou, e ela chega a seu julgamento sem ministros da Justiça e da Casa Civil. O vice ainda se beneficia da munição pesada de Eduardo Cunha contra o governo.

    É assim que Temer pode chegar à Presidência neste domingo. Se perder, porém, manterá o posto para o qual foi eleito. Com impeachment ou sem ele, o vice-presidente também gozará de autoridade antes inexistente. Uma derrota no plenário não eliminará sua nova força por completo.

    Acontece que todo processo sucessório é um jogo aberto e este aqui, por não ter script, é suscetível a surpresas de último minuto.

    É por isso que nas próximas cem horas, o vice-presidente enfrenta seu teste mais difícil. Como todo jogador diante de um adversário mais forte, porém enfraquecido, seu desafio é impor à sua opositora perdas graduais e constantes até a reta final. Isso significa provocar deserções inesperadas na base do governo.

    Eis o motivo pelo qual a estratégia de Michel Temer nestes quatro dias tem três elementos centrais.

    Primeiro, ele tenta mostrar a deputados indecisos que podem contar com sua lealdade no futuro. Não é promessa fácil de fazer, tamanho o número de deputados que passará fatura em caso de vitória. Um eventual governo Temer não terá espaço para satisfazer a todos por igual, e quem chega por último nem sempre terá preferência sobre quem chegou primeiro.

    Segundo, o vice-presidente assegura a deputados indecisos que seu plano econômico é exequível. Sem estabilização genuína, seu governo seria tão impopular quanto incapaz de distribuir bons recursos à base aliada.

    Por fim, Temer cuida dos sinais que dá para o futuro. Uma promessa oficial de não ser candidato em outubro de 2018 pode reduzir-lhe a rejeição junto à opinião pública. Porém, ela aumenta as incertezas daqueles parlamentares que temem ficar desprotegidos sob um presidente que teria apenas 30 meses para governar. Nas conversas ao pé do ouvido, portanto, Temer é forçado a adotar a ambiguidade, sua velha e fiel escudeira.

    matias spektor

    É doutor pela Universidade de Oxford e ensina relações internacionais na FGV. Escreve às quintas.

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