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    Matias Spektor

    Temer precisará conceber uma nova doutrina de política externa

    01/09/2016 02h00

    Gabriel Mascarenhas/Folhapress
    Michel Temer toma posse no SenadoFoto:Gabriel Mascarenhas/Folhapress
    Michel Temer (PMDB) toma posse no Senado Federal

    O antipetismo acorda nesta quinta (1º) com a sensação de página virada. Depois de treze anos, a troca definitiva de governo estaria abrindo, por si só, um capítulo novo e melhor na vida do país. Empossado o novo presidente, bastaria dar tempo ao tempo.

    Essa tendência à acomodação e ao marasmo é perigosa, pois vivemos um momento de verdadeira emergência nacional. Encerrar a crise política instalada pelo processo de impeachment é condição necessária para avançar, mas está longe de ser suficiente.

    Esse drama pode ser visto em todas as áreas da vida pública. Na área externa não é diferente.

    O governo Temer já começou a revisar as ênfases diplomáticas do PT, e sua primeira viagem internacional promete inaugurar um novo estilo na condução dos negócios estrangeiros.

    Ninguém sabe, porém, até que ponto o governo pretende atualizar a doutrina brasileira de política externa. Esse esforço de modernização é essencial porque a estratégia internacional dos últimos anos, com seus êxitos e fracassos, encontra-se esgotada.

    A atuação do Brasil no exterior demanda oxigenação tão profunda quanto urgente.

    A adaptação da política externa será uma tarefa dificílima: não há consenso sobre o que fazer, nem recursos disponíveis para grandes empreitadas. A tendência da comunidade responsável por pensar o lugar do Brasil no mundo, nos setores público e privado, é manter-se escorada nos velhos paradigmas.

    O exercício de reflexão estratégica, se acontecer um dia, identificará de maneira precisa os problemas que afligem o Brasil no mundo. Daí, surgirá uma visão mais moderna e melhor equipada para lidar com os desafios ao redor.

    Um exemplo é a inserção econômica do Brasil no mundo: os dogmas que governam o comportamento diplomático nessa área tendem a ser anacrônicos, além de perversos, já que beneficiam poucos grupos com acesso privilegiado às altas rodas do governo, em detrimento da maioria.

    Outra ilustração é nossa estratégia regional. Há trinta anos, o Brasil criou e financiou instituições dedicadas a unir a América do Sul ao seu redor. Depois de enorme êxito inicial, o projeto empacou. Somente um exercício de criatividade permitirá tirá-lo do atoleiro.

    O mesmo vale para a governança global. Por meio de coalizões de países emergentes, o Brasil ensaiou um projeto para reformar regras e organismos internacionais, reduzindo a influência dos países mais poderosos. Esse projeto, tão valioso, teve ganhos iniciais, mas hoje está paralisado. Se quisermos uma multipolaridade benigna, precisaremos de uma nova abordagem.

    O governo encerrado ontem deixou uma doutrina de política externa ambiciosa, porém caduca. Urge conceber a boa e necessária alternativa.

    matias spektor

    É doutor pela Universidade de Oxford e ensina relações internacionais na FGV. Escreve às quintas.

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