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    Matias Spektor

    Sem saída militar, a crise da Coreia do Norte pede diplomacia

    14/09/2017 02h00

    Britta Pedersen/AFP
    Activists of the non-governmental organization "International Campaign to Abolish Nuclear Weapons (ICAN)" wear masks of US President Donal Trump and leader of the Democratic People's Republic of Korea Kim Jon-un while posing with a mock missile in front of the embassy of Democratic People's Republic of Korea in Berlin, on September 13, 2017. / AFP PHOTO / dpa / Britta Pedersen / Germany OUT ORG XMIT: 90-014441
    Ativistas contra o uso de armas nucleares protestam com máscaras de Trump e Kim Jon-un

    Quando Truman soube que a União Soviética estava construindo sua primeira bomba atômica, na década de 1950, quis atacar as instalações nucleares de imediato. Desistiu depois de entender os riscos embutidos.

    Dez anos depois, quando Kennedy descobriu os planos de Mao Tsé-Tung para fazer a bomba, propôs aos soviéticos um ataque conjunto contra as instalações nucleares da China. Desistiu depois de avaliar os custos e de ouvir uma negativa de Moscou.

    Todo presidente americano contempla o uso da força militar contra países inimigos ou rivais que estão prestes a entrar ao clube nuclear.

    Agora, Donald Trump segue o velho roteiro à risca.

    Diante dos testes da Coreia do Norte nos últimos meses, o presidente ameaçou o regime em Pyongyang, que, segundo ele, "só entende uma coisa". Sua embaixadora na ONU avaliou que Kim Jong-un está "implorando por guerra", ao passo que seu secretário de Defesa prometeu manter "todas as opções sobre a mesa", inclusive uma intervenção militar. Utilizaremos "equipamento novo e belo, o melhor do mundo", prometeu Trump.

    Uma intervenção americana na Coreia do Norte seria um desastre de proporções épicas. Mesmo gozando de força superior, as Forças Armadas americanas não conseguiriam garantir a eliminação de todas as armas norte-coreanas, muitas das quais se encontram escondidas em locais secretos. Sob ataque, Pyongyang provavelmente revidaria, atacando a Coreia do Sul ou o Japão, dois aliados americanos. O resultado seria uma catástrofe humanitária sem proporções. De quebra, os Estados Unidos perderiam sua alavancagem política na Ásia por um século, trazendo ainda mais instabilidade a uma região muito volátil.

    Trump precisará aprender a conviver com uma Coreia do Norte nuclearizada, tal qual, antes dele, Truman e Kennedy aprenderam a conviver com armas nucleares na URSS e na China. Como nada fará o regime em Pyongyang desmantelar seu arsenal, instrumento de sobrevivência num ambiente externo hostil, não há saída militar factível para o problema.

    Há entretanto, saída política. O governo em Pyongyang declararia uma moratória nos testes que vem fazendo, em troca de concessões tais como diálogo direto com os Estados Unidos (forçando Washington a reconhecer a legitimidade do regime), a suspensão temporária de exercícios militares americanos nas fronteiras do país e a promessa de suspensão das sanções do Conselho de Segurança da ONU, caso o diálogo seja exitoso. Assim como ocorreu no passado, o objetivo americano não seria o de eliminar o programa nuclear norte-coreano, mas congelá-lo no ponto em que está hoje.

    É uma solução imperfeita e arriscada, mas é o prato mais palatável do cardápio.

    matias spektor

    É doutor pela Universidade de Oxford e ensina relações internacionais na FGV. Escreve às quintas.

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