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    Matias Spektor

    Picuinha atrapalha a relação entre Temer e Macri

    19/10/2017 02h00

    Pedro Ladeira - 7.fev.2017/Folhapress
    O presidente Michel Temer e o presidente argentino Mauricio Macri, após almoço no Palácio do Itamaraty, em Brasília, em fevereiro de 2017
    O presidente Michel Temer e o presidente argentino Mauricio Macri, em Brasília

    A popularidade de um presidente argentino e sua capacidade de governar o país sempre estão atreladas ao governo brasileiro. Decisões tomadas na Esplanada dos Ministérios afetam em cheio não apenas a taxa de emprego, o índice de inflação e a taxa de juros dos argentinos, mas também seus índices de violência causada por tráfico de drogas, de armas, de pessoas e de dinheiro lavado e pelo crime organizado.

    Não surpreende, portanto, que a equipe de Mauricio Macri recebesse a notícia da queda de Dilma Rousseff com animação contida. Tampouco chama a atenção que Macri optasse por uma aproximação com Michel Temer.

    Apesar de o mandatário brasileiro estar longe da imagem de modernidade e viço jovial que a propaganda do macrismo gosta de projetar, o presidente argentino deu passos largos em direção ao novo comando em Brasília.

    Quando o coletivo bolivariano da América do Sul gritava contra o "golpe", Macri saiu para pôr panos quentes. Nas reuniões do G20, onde virou estrela, repetiu mensagens positivas sobre o Brasil, mesmo quando a Operação Lava Jato apontava na direção contrária. E quando o Mercosul rachou, por causa da Venezuela, Buenos Aires tirou o pé do acelerador para acomodar o timing de Brasília.

    Tais gestos não eram de graça. Em visita oficial ao Palácio do Planalto, em fevereiro passado, Macri trouxe uma lista de demandas. O Brasil deveria parar de fazer vista grossa para o desgoverno na fronteira —problema com impacto político direto no país vizinho.

    O Brasil deveria se engajar na harmonização normativa do Mercosul, assunto maior para um país que, neste ano, prevê um deficit comercial conosco da ordem de US$ 7 bilhões. O encontro presidencial foi exitoso, e os mandatários assinaram um plano de ação conjunto para arrumar a casa. Depois de anos de paralisia, a relação bilateral começou a sair do buraco em que se encontrava.

    De lá para cá, entretanto, o ruído aumentou. Os argentinos começaram a reclamar da lentidão brasileira para implementar a agenda conjunta, sem entender a lógica dos grupos de interesse que travam ou dificultam o progresso na dúzia de ministérios, agências e autarquias envolvidos na relação com a Argentina.

    Há três semanas, Macri mandou uma carta a Temer, pedindo celeridade. Em Brasília, houve perplexidade e o tempo fechou. Há quem pense ser este um capricho da Casa Rosada. Na realidade, trata-se do instinto de um candidato à própria reeleição.

    Será um desperdiço se tal picuinha atrapalhar o raro alinhamento que existe entre os dois governos. O momento é bom para fazer a relação avançar.

    matias spektor

    É doutor pela Universidade de Oxford e ensina relações internacionais na FGV. Escreve às quintas.

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