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    Matias Spektor

    Crime transnacional determina posição do Brasil no mundo

    02/11/2017 02h00

    Eduardo Knapp-25.nov.2010/Folhapress
    SAO PAULO, SP, BRASIL, 06-09-2013 11h50:***Especial para DOMINGO/FOLHA***. Retrato do musico e cantor Benito Di Paula,71, na casa (no Morumbi Rua Viriato Correira) no segundo andar onde ficam seus santos. Imovel sera desapropriada para obras do Metro.O caso foi parar na justica pois segundo Benito o Metro ofereceu apenas 550 mil pela casa mas ele pede de 2 a 4 milhoes. (Foto Eduardo Knapp/Folhapress.COTIDIANO)
    Placa anunciando obra da Odebrecht em Luanda, capital de Angola

    O tema de política externa que mais afeta a vida cotidiana dos brasileiros é aquele que recebe menos atenção: a presença do crime organizado em nossas relações exteriores.

    O fenômeno vem sendo exposto há coisa de quatro anos e é simples de entender. Há quadrilhas enquistadas no Executivo e no Legislativo que operam de modo internacional, seguindo duas dinâmicas paralelas.

    Por um lado, essas máfias superfaturam contratos públicos para gerar recursos de financiamento de campanha e acionam, para esse fim, uma rede internacional de doleiros para lavar o dinheiro. Como essas quadrilhas precisam manter a boquinha operante, elas instrumentalizam visitas oficiais, acordos diplomáticos e linhas de crédito no exterior, com a anuência e cumplicidade de bancas de advogados, diretores de empresas estatais, marqueteiros e bancos estrangeiros. Os esquemas da Odebrecht e outras empreiteiras ilustram o ponto.

    Por outro lado, essas máfias também tiram uma lasquinha do esquema multimilionário de crime organizado nas regiões de fronteira, onde há um fluxo intenso de comércio ilegal de drogas, armas e pessoas, além de pirataria, fraude de cartões de crédito e de documentos. Agentes públicos em prefeituras, Assembleias estaduais, Congresso e Judiciário cobram pedágio de gangues que usam extorsão, violência e o assassinato de rivais para impor a ordem, como tem mostrado o noticiário.

    Assim, da Colômbia à França, de Angola a Cingapura, de Ponta Porã a Tabatinga, o crime transnacional estrutura parte da presença do Brasil no mundo.

    Tais redes criminosas constituem a principal ameaça à democracia brasileira, pois corroem as instituições que deveriam prover bens públicos. A sociedade fica à mercê do arbítrio e da lei do mais forte, como ocorre em regimes autoritários.

    A luta contra essas máfias avançou muito nos últimos anos, em formato também transnacional. Desde o escândalo do Banestado (1996), criou-se uma rede de promotores, juízes, policiais e bancos privados do Brasil que trabalha em parceria com suas contrapartes estrangeiras. Esse elo permitiu a condenação de malfeitores e a repatriação de milhões de dólares roubados.

    A luta, porém, é dura e de resultado incerto. A máfia é muito mais poderosa do que a rede anticorrupção porque aquela, além de contar com seu arsenal de métodos ilegais, ocupa posições no seio do Estado brasileiro. A assimetria de forças é brutal.

    Se um dia formos governados por gente que não integra quadrilha alguma, o grupo no poder terá a oportunidade de declarar guerra contra o crime transnacional que subverte a democracia, empobrece a sociedade e gera má governança para todos.

    matias spektor

    É doutor pela Universidade de Oxford e ensina relações internacionais na FGV. Escreve às quintas.

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