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    Matias Spektor

    Sem medo do eleitor, deputados empurram o país à falência

    23/11/2017 02h00

    Nesta quarta ficou patente a dinâmica perversa do sistema político brasileiro. Às vésperas das eleições de 2018, os deputados rejeitaram a decisão que melhor serve os eleitores e optaram por aquela que mais castiga a vasta maioria dos cidadãos: juntos, os congressistas operaram para desidratar a reforma da Previdência.

    Uma reforma profunda, porém, deveria ser prioridade para os congressistas interessados na própria reeleição. Não é só que as regras atuais de aposentadoria beneficiam os ricos em detrimento dos pobres, repassando a conta à maioria humilde dos contribuintes. As contas desequilibradas da Previdência ainda empurram o país na direção do aumento brusco da inflação –um desfecho desastroso para brasileiros de todas as classes.

    Como é que os deputados eleitos numa democracia consolidada como a nossa podem adotar uma posição que, na essência, empurra o país à falência?

    A explicação é simples. Em nosso sistema político, o congressista não paga custo político quando suas decisões geram má governança. Se as contas públicas explodirem numa espiral inflacionária, o eleitor colocará a culpa no Executivo. Ciente disso, o Legislativo condiciona seu apoio ao Executivo à concessão de boquinhas de toda a natureza. Um deputado brasileiro tem mais medo de grupos de interesse como o funcionalismo do que de seus próprios eleitores.

    Essa dinâmica tão própria de nosso presidencialismo cobra uma fatura alta. Em estudo recente, o Banco Mundial mostrou que, sem uma mudança de curso radical, daqui a 13 anos, aposentadorias e pensões sozinhas ocuparão 100% do limite de gastos do governo. Muito antes dessa data fatídica, as contas públicas federais terão entrado em colapso, fazendo a situação atual do Estado do Rio de Janeiro parecer mero capítulo de um drama menor.

    O próprio governo doura a pílula. Quando a liderança do Planalto na Câmara dos Deputados declara que a não aprovação da reforma transformará o Brasil na Grécia, introduz uma analogia equivocada. Quem nos dera ser como a Grécia, que repassou sua conta à Alemanha.

    Em nosso caso, não há credor de última instância. Com Trump na Casa Branca, será difícil pedir dinheiro ao Tesouro americano, como fez FHC em 1998. Também será duro costurar um acordo-ponte com o FMI, tal qual Lula fez em 2002. E nada sugere que haverá uma nova alta de commodities à espreita.

    Num sistema político funcional, os deputados teriam pânico de sancionar a falência do Brasil. Eles optariam por aprovar medidas impopulares agora para não ter de enfrentar o eleitor raivoso na hora da explosão.

    Aqui não é assim. Nosso sistema político é um espanto.

    matias spektor

    É doutor pela Universidade de Oxford e ensina relações internacionais na FGV. Escreve às quintas.

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