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    Matias Spektor

    Expulsão de embaixador cria oportunidade para o Brasil

    28/12/2017 02h00

    A expulsão do embaixador do Brasil em Caracas reintroduz ao debate público a difícil questão de como lidar com o regime venezuelano.

    Desde a posse, Michel Temer adotou três medidas. Primeiro, liderou com a Argentina o processo de sanção: a Venezuela foi suspensa do Mercosul até a restauração das garantias democráticas. Segundo, o governo brasileiro ofereceu ajuda humanitária na forma de alimentos e remédios. Terceiro, enquanto o governo em Brasília aumentava o tom das críticas, a embaixada do Brasil em Caracas evitou antagonizar o governo em público, mantendo contato com diversos setores da sociedade e incentivando o diálogo entre chavismo e oposição.

    Chegou a hora de revisar essa política. Afinal, de lá para cá, Nicolás Maduro só fez aumentar a repressão, rejeitando a ajuda humanitária oferecida e expulsando diplomatas estrangeiros. A nova Assembleia Constituinte eliminou o que restava de democracia, ao passo que a mudança das regras eleitorais escancarou o horror que vem à frente.

    Qual o ajuste a fazer?

    É necessário reconhecer que o governo em Caracas não tem condições de promover diálogo genuíno com a oposição. Também é hora de reconhecer que o regime não aceitará ajuda humanitária, pois isso demandaria um cronograma de restauração dos direitos hoje suspensos. Nada indica que haverá uma mudança no chavismo a curto prazo e nada garante que a transição, quando vier, será para uma situação de mais democracia e respeito às liberdades civis e aos direitos políticos.

    Por isso, nossa diplomacia tem de mirar os próximos anos, não os próximos meses, sempre de olho em criar condições para uma mudança de caráter democrático, impedindo que o vizinho se transforme num Estado quebrado ou falido. Para nós, uma Venezuela arrebentada é um problema de segurança nacional.

    Um ajuste dessa natureza levaria o Brasil trabalhar para (a) estabelecer canais de comunicação reservados com as Forças Armadas venezuelanas, jogador central na futura transição, (b) estabelecer diálogo discreto, porém constante, com chavistas moderados e grupos dissidentes, hoje exilados em Bogotá, (c) coordenar com terceiros países os termos do grande pacote de ajuda que será imperativo quando a transição ocorrer, (d) deixar claro a China e Rússia que o apoio econômico por elas dado à cúpula do regime venezuelano fere interesses brasileiros, e (e) denunciar nos foros relevantes, como vem sendo feito, os desmandos de um regime que espalha violência, arbítrio e pobreza.

    Uma política assim teria o objetivo concreto e factível de posicionar o Brasil para cumprir um papel construtivo na transição venezuelana que, mais dia, menos dia, virá.

    matias spektor

    É doutor pela Universidade de Oxford e ensina relações internacionais na FGV. Escreve às quintas.

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