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    Maurício Stycer

    A fila andou e deixou mágoas

    12/07/2015 02h05

    A história do humor na televisão é repleta de altos e baixos em matéria de qualidade, bem como de avanços e recuos em relação ao que pode ou não ser motivo de piada.

    Também é um processo que obedece ao roteiro clássico da indústria do entretenimento, a saber, o da consagração e, em algum momento, do desgaste da imagem de seus protagonistas.

    A estreia do humorístico "Tá no Ar" em abril de 2014, pouco mais de 15 meses depois da exibição do último programa da turma do "Casseta & Planeta", é um marco importante nesta história. Representa uma espécie de "troca de guarda" dentro da Globo ainda não totalmente assimilada.

    Um debate realizado nesta semana em São Paulo, promovido pelo festival Risadaria, expôs aspectos inéditos dessa transição e mostrou como algumas feridas ainda não fecharam.

    O tema geral do encontro, "A Importância do Humor na TV", serviu de pretexto para um diálogo franco entre um dos criadores do "Tá no Ar", Marcius Melhem, e um dos fundadores do "Casseta", Marcelo Madureira. Fui o mediador da conversa, que também contou com a participação de Bruno Mazzeo, Paulo Bonfá e Caco Galhardo.

    Confessando-se "ressentido", Madureira primeiro reclamou da Globo por ter tirado o "Casseta" do ar. "A Globo hoje mais parece com a IBM do que com uma produtora de conteúdo. Nada do que faz acontece."

    Em seguida, referindo-se ao panorama do humor atual na televisão, atacou: "O que é bom não é novo. O que é novo não é bom".

    A primeira parte da boutade foi uma clara referência ao "Tá no Ar" e ao novo "Zorra", ambos sob responsabilidade direta de Melhem, que respondeu: "Humor é processo. Quero que reconheçam o lugar para onde a gente levou isso".

    O ressentimento de Madureira com a Globo diz respeito às muitas restrições impostas ao "Casseta & Planeta" ao longo dos anos, notadamente a proibição de mencionar marcas de produtos, emissoras e programas da concorrência, além de atenuar a crítica política.

    Melhem reivindica crédito pela batalha que levou à derrubada de todos estes vetos. Convidado por Carlos Henrique Schroder, diretor-geral da Globo desde 2013, a participar de um fórum destinado a discutir propostas para a emissora, o humorista afirma que o seu primeiro comentário foi: "Se não tirar o [departamento] jurídico da frente, não dá para fazer humor".

    O novo "Zorra", no ar desde maio de 2015, e o "Tá no Ar", que já teve duas temporadas exibidas, estão aí para confirmar que a emissora realmente vive uma nova fase em matéria de humor.

    Melhem contou que semanalmente leva a Schroder um DVD com os quadros que considera potencialmente mais polêmicos. E garante que nunca houve um veto. "A emissora é minha fiadora", disse.

    Um esquete sobre delação premiada, no qual políticos fictícios são citados, levou o diretor da emissora a perguntar se os nomes mencionados não correspondiam a alguma figura real. Melhem contou que não havia pesquisado isso antes e se deu conta de que poderia haver um paralelo, sim. Um nome, então, foi cortado, mas o quadro foi ao ar.

    Resta saber até onde -e até quando- irá esta "abertura" da emissora.

    mauricio stycer

    É jornalista, repórter e crítico e autor de 'Adeus, Controle Remoto'.
    Escreve aos domingos.

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