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    Maurício Stycer

    Olhando para trás

    18/10/2015 02h00

    Em fevereiro, ao ser anunciado que Xuxa acertou com a Record, depois de quase 30 anos na Globo, levantei algumas dúvidas sobre o futuro dessa iniciativa.

    No texto ("O enigma Xuxa"), lembrei que, ao trocar o público infantil pelo adolescente e adulto a partir do final dos anos 1990, a apresentadora nunca mais fez o mesmo sucesso do início da carreira. Dizia, por isso, que havia muitas dúvidas sobre o que Xuxa teria a oferecer no comando de uma nova atração.

    Para a Record, porém, essa questão parecia menos importante do que a possibilidade de faturar com o prestígio que vislumbrava migrar junto com a apresentadora.

    Por seis meses, até a estreia, em agosto, a emissora fez exatamente isso, exibindo e "vendendo" Xuxa em programas da casa, eventos midiáticos e campanhas publicitárias.

    Nas primeiras entrevistas que deu, Xuxa prestou reverência a Silvio Santos e Hebe Camargo, mas disse que procuraria fazer um programa nos moldes do comandado por Ellen DeGeneres nos Estados Unidos.

    A atração americana é um misto de "talk show" com programa de auditório, no qual DeGeneres recebe convidados famosos, apresenta números musicais, exibe reportagens com histórias curiosas e interage com a plateia, que é frequentemente premiada com brindes.

    A decisão de desenvolver um programa calcado em outro existente é decepcionante, mas honesta –acho melhor reconhecer a incapacidade de criar algo original do que tentar enganar o público com "novidades".

    Além disso, ao anunciar que imitaria Ellen DeGeneres, Xuxa procurou se distanciar do modelo principal de programa de auditório da Record, altamente apelativo, baseado na exploração de dramas humanos e "histórias de superação".

    Exibidos nove episódios do seu programa, porém, Xuxa mostra que está seguindo um caminho próprio. O que, infelizmente, é muito pior do que copiar DeGeneres, Hebe Camargo ou Silvio Santos.

    Xuxa está fazendo um programa sobre Xuxa, mais especialmente sobre o fascínio que ainda exerce sobre quem foi "súdito" da "rainha dos baixinhos" em seu tempo áureo. É um universo razoável de pessoas, tanto anônimas quanto famosas, que cresceram vendo a apresentadora chegar ao palco numa nave espacial e cantar "Ilariê".

    Toda semana, invariavelmente, a apresentadora mostra alguma fã sendo surpreendida por sua presença. O resultado é sempre idêntico: a pessoa primeiro manifesta incredulidade, depois grita ao descobrir que está diante de Xuxa e chora. Na última segunda-feira (12), essa mesma situação ocorreu três vezes.

    Os convidados famosos da apresentadora, igualmente, participam desse culto à personalidade. Xuxa é quase sempre o assunto das entrevistas que ela mesma faz.

    Outro tema que tem tido bastante repercussão são os seus comentários sobre assuntos que supostamente não pode tratar na atração: religião, política e, dependendo do horário, sexo. Xuxa posa de rebelde, fazendo piadas sobre essas restrições –um sinal, na verdade, da sua grande infantilidade.

    Aos 52 anos, Xuxa procura manter viva a lembrança de um tempo que passou. Se não tiver repertório para se reciclar e sair dessa, seu futuro na televisão não será longo.

    mauricio stycer

    É jornalista, repórter e crítico e autor de 'Adeus, Controle Remoto'.
    Escreve aos domingos.

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